
"Muitos ainda criticam porque somos presos, mas eu acredito que as pessoas não devem julgar pela aparência”. Esse é o desabafo de um dos detentos do Conjunto Penal de Feira de Santana, identificado apenas pelas iniciais T.C.S., de 38 anos. De trás das grades há quatro anos, ele é um dos voluntários do Projeto Fênix, que promove a ressocialização dos internos por meio de atividades de pesca e de criação de tilápias dentro da unidade prisional.
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Por trás dos muros pálidos de concreto, cerca de oito presidiários botam as ‘mãos à obra’ com a pesca dos peixes distribuídos em três tanques na área aberta. Os frutos do trabalho duro impactam positivamente em parte da sociedade, com a produção enviada para o Projeto Bahia sem Fome, ajudando as famílias que vivem uma vulnerabilidade alimentar no estado.
Qualquer um pode estar no nosso lugar. Aqui, tem muita gente que quer se ressocializar, assim como a gente
expressou o detento T.C.S., de 38 anos
“Tem muitos pais de família, pessoas que erraram, mas querem mudar. Quem está lá fora precisa entender que aqui tem pessoas tentando melhorar. Eu sou pai e acredito que ninguém deve ser julgado só pelo que fez”, expressa, em entrevista exclusiva ao Portal MASSA!.
Sempre com muita vontade de ‘trampar’ e disposição, os presidiários da unidade se dedicam periodicamente à manutenção dos tanques, cuidando do ajuste do pH da água, da filtragem e outros detalhes. Eles também retiram os pescados e levam até a balança, onde registram peixes de 50, 70 e, até mesmo, 100 quilos. Todos são armazenados para, depois, serem distribuídos às pessoas que mais precisam.
Saber que estamos ajudando a matar a fome de muitas pessoas que precisam lá fora é muito bom
“A gente vê na TV as pessoas sofrendo com a falta de comida, com as chuvas, deslizamentos, e saber que estamos colaborando é muito gratificante. A gente faz tudo com muita gratidão e amor, porque se não fizer com amor, o trabalho não funciona”, declara T.C.S.

Porta de entrada
Antes de iniciarem os trabalhos do projeto com as tilápias, que está prestes a completar um ano de existência, uma turma de presos passou por cursos de especialização, além de auxiliar na construção de toda a estrutura necessária para a realização do mesmo e cuidarem dos peixes até o dia de pesca, sempre com um policial supervisionando o serviço.
Em entrevista ao Portal MASSA!, o diretor do Conjunto Penal, Júnior Freitas, explicou que a maioria dos internos participantes são os mesmos que começaram, mas os ensinamentos são rotativos: “O conhecimento já foi passado adiante. Eles mesmos replicaram o que aprenderam para os que chegaram depois. É um trabalho contínuo, que não pode parar, porque qualquer descuido pode causar a mortandade dos peixes”.
Entre os participantes está T.C.S, que foi preso há quatro anos, abraçou a iniciativa da SEAP, em parceria com o Governo do Estado, e hoje vê o seu esforço sendo recompensado, com a remissão da pena com base nos dias trabalhados e a contribuição para uma boa causa. Segundo ele, seu maior objetivo é se redimir pelos erros do passado e recomeçar.
“Nasci e me criei na roça. Por causa de um delito, estou aqui, mas estou aqui para pagar, primeiro para Deus, depois para a justiça. Não pretendo mais errar. Estamos aqui trabalhando, sendo ajudados e ajudando. Temos esse projeto dos peixes que eles trouxeram para a gente trabalhar, e isso é muito importante. Cada vez mais adquirimos conhecimento”, diz.

O aprendizado muitas vezes é levado para a parte de fora do presídio, quando algum dos detentos é posto em liberdade. Segundo o diretor Júnior, isso acontece frequentemente com os liberados, a exemplo de um deles que hoje tem como fonte de renda principal a pesca e venda, utilizando tudo que aprendeu na unidade prisional.
“Em Baixa Grande um rapaz que fez o curso aqui saiu da penitenciária e abriu seu próprio campo de pesca, com apoio da Bahia Pesca. Montou o tanque de peixes dele e hoje está negociando o próprio produto. Isso acontece de forma recorrente. Aqui oferecemos várias capacitações e muitos replicam o que aprenderam. Eles continuam sendo monitorados e aplicam lá fora o que aprenderam aqui dentro”, destaca.
Histórias como essa se tornam inspirações pra quem ainda está dentro da cadeia, como o detento de inicial T. “Já conversei com o diretor, e ele me falou dos internos que saíram daqui e seguiram no ramo da pesca. Eu penso em seguir, porque já tenho experiência na roça, e o manejo dos peixes ampliou meu conhecimento. É um negócio que dá resultado”, afirma.

Pesca e distribuição
A equipe de reportagem do MASSA! acompanhou de perto o processo de pesca e entrega das tilápias para famílias participantes do projeto Bahia Sem Fome. Porém, o processo inicia tempos atrás e passa por várias etapas até a fase de pescaria, conforme detalhado pelo diretor da unidade.
“O período de retirada é, em média, de 6 a 7 meses após o início da engorda. Quando chega a época da pesca levamos em torno de 30 dias para concluir, pois vamos fazendo a retirada de forma gradual. Por exemplo, hoje mesmo vamos coletar cerca de 50 a 70 quilos, amanhã retiramos mais, sexta-feira também e assim vai”, conclui.
Muitas vezes, os internos criam uma verdadeira ligação com os animais e a pescaria acaba marcando o fim entre uma relação sentimental construída pelo afeto entre o homem e o peixe: “É um processo que emociona bastante. A gente vê os peixinhos pequenos chegando, cuidamos deles, e quando chegam na beira do tanque, eles vêm nos receber. Na hora da colheita, às vezes corta o coração, dá aquela pena, mas a gente fica feliz porque sabe que está ajudando a matar a fome de quem precisa”.

Braçadas largas contra a fome
Maior conjunto penal da Bahia, possuindo cerca de 2.200 internos, a penitenciária de Feira de Santana é palco de diversos projetos com foco na ressocialização. 40 destes detentos são capacitados a cada sete meses para 'trampar' no manejo dos peixes e garantir, em média, a doação de três toneladas neste período ao Bahia sem Fome.
Os resultados do projeto foram celebrados por José Castro, secretário da SEAP, em entrevista exclusiva ao Portal MASSA!: "É um número expressivo e muito satisfatório para a gente, para o sistema prisional como um todo, que está mostrando que os presos da Bahia são úteis à sociedade. Eles estão retornando, de alguma forma, um bem para a sociedade. O preso da Bahia está aqui também no combate à fome".
Na verdade, a ressocialização é a grande chave para a mudança de mentalidade desse pessoal. É a segunda chance que o Estado está ofertando
José Castro, secretário da SEAP
@jornalmassaoficial "Muitos ainda criticam porque somos presos, mas eu acredito que as pessoas não devem julgar pela aparência”. Esse é o desabafo de um dos detentos do Conjunto Penal de Feira de Santana, identificado apenas pelas iniciais T.C.S., de 38 anos. De trás das grades há quatro anos, ele é um dos voluntários do Projeto Fênix, que promove a ressocialização dos internos por meio de atividades de pesca e de criação de tilápias dentro da unidade prisional. Por trás dos muros pálidos de concreto, cerca de oito presidiários botam as ‘mãos à obra’ com a pesca dos peixes distribuídos em três tanques na área aberta. Os frutos do trabalho duro impactam positivamente em parte da sociedade, com a produção enviada para o Projeto Bahia sem Fome, ajudando as famílias que vivem uma vulnerabilidade alimentar no estado. Este é o quarto capítulo da série Ressocialização: a luta contra a invisibilidade. No próximo dia 29 de agosto, o quinto episódio abordará mais um projeto social que também transforma vidas e oferece novas oportunidades. 📲 Saiba mais em jornalmassa.com.br ✍🏽 Bruno Dias #MASSA #GrupoATARDE
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Série especial
Histórias como essas mostram como os projetos de ressocialização dentro dos presídios podem ser importantes para reabilitar detentos que cumprem pena e se arrependem dos seus atos. O tempo atrás das grades se transforma em um momento de reflexão, mudança e, acima de tudo, esperança de fazer tudo diferente.
Este é o quarto capítulo da série Ressocialização: a luta contra a invisibilidade. No próximo dia 29 de agosto, o quinto episódio abordará mais um projeto social que também transforma vidas e oferece novas oportunidades.