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8 OU 80 - 20/12/2024, 06:50 - Paola Pedro - Atualizado em 20/12/2024, 07:28

Pais podem ‘bater de frente’ com proibição do celular em sala de aula? Entenda polêmica

Em bate-papo com o MASSA!, especialistas debateram sobre Projeto de Lei aprovado

Professores já bateram o martelo sobre necessidade de moderação no uso da tecnologia
Professores já bateram o martelo sobre necessidade de moderação no uso da tecnologia |  Foto: Shirley Stolze/Ag. A TARDE

A aprovação do Projeto de Lei 302/2023, que proíbe o uso de celular em sala de aula em Salvador, tem causado um ‘rebuliço’ na comunidade escolar. A discussão também alcançou o cenário nacional, após ser aprovada pelo Senado, nesta quarta-feira (18).

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Após professores e estudantes opinarem sobre o uso do celular durante a aula atrapalhar ou não o desempenho acadêmico, o Portal MASSA! conversou com a advogada criminalista Nívea Gonçalves, especialista em Direito da Criança e do Adolescente, para entender os detalhes da aplicabilidade da norma.

Esta medida, inclusive, já deve começar a valer no ano letivo de 2025, após sanção do prefeito Bruno Reis, da capital baiana, e do presidente Lula, em todo o país.

Com mais de 18 anos de experiência na área de Infância e Juventude, a profissional compartilhou com a reportagem sua vivência com instituições de ensino em São Paulo, onde já são operacionalizadas as proibições do uso do aparelho em ambiente escolar.

“A lei vai atuar muito mais no sentido preventivo do que depressivo, de punição. O ideal é que as escolas adotem essa postura de conscientização, de educação e prevenção através de avisos na sala de aula, da própria atuação dos professores na sala de aula, apesar de não ser um desafio fácil para o educador”, disse.

Nívea Gonçalves é advogada criminalista especializada em Direito da Criança e do Adolescente
Nívea Gonçalves é advogada criminalista especializada em Direito da Criança e do Adolescente | Foto: Acervo pessoal/Instagram (@niveagoncalves_)

Nívea Gonçalves falou ainda sobre a necessidade primordial da preparação do corpo docente - professores e outros profissionais da Educação - principalmente, para como conduzir isso em sala de aula, de forma a não violar a dignidade do adolescente.

Segundo a mestre em Criminologia, é necessário utilizar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de maneira sábia.

“Crianças e adolescentes não são propriedades dos pais, eles são sujeitos de direitos protegidos por Estatuto, que prevê que os pais precisam observar, exercendo seu poder familiar, os direitos previstos no ECA”, explicou a especialista.

Aspas

Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.

“Os pais que ‘baterem de frente’ com a instituição de ensino que está voltada à proteção integral e ao atendimento à dignidade da pessoa humana da criança e do adolescente, são pais que merecem a intervenção e não somente na área administrativa, através do Conselho Tutelar”, completou.


Violação

Para Nívea, o celular utilizado em sala de aula se transforma em um aparelho que viola esses próprios direitos. “Viola o direito à Educação quando tira a concentração em sala de aula, quando faz com que a criança e o adolescente se isole em um canto e perca a hora do recreio e das atividades”, exemplificou.

Aspas

Precisamos começar a entender que é dever de todo mundo preservar a integridade física e psíquica dessa pessoa em desenvolvimento

Nívea Gonçalves, advogada criminalista


“A gente tem que interpretar esse artigo de forma a proteger integralmente a criança e o adolescente. Não podemos dizer que proibir a utilização [do celular] é violar o direito à intimidade. Muito pelo contrário: eles precisam de um direcionamento, sem confisco, mas como conscientização, respeitando o grau de desenvolvimento de cada um, para que consigam chegar à fase adulta e siga sua vida”, falou.

A advogada reforçou também que a norma proposta não tem como objetivo restringir o porte do aparelho eletrônico, mas contemplar sua utilização em espaços voltados para o aprendizado: “Claro que hoje não podemos nos dissociar das atividades pedagógicas online”.

“Eu vejo, inicialmente, a norma com bons olhos. O que faz ela se mostrar ineficiente é exatamente quem a aplica, quem precisa observá-la: sociedade, família… Por isso é tão importante a conscientização e integração entre os pais e as escolas”, concluiu.

Esse equilíbrio de uso e parceria entre instituições sociais também foi citado pela psicopedagoga Sheyla Argolo. Mestranda em Educação com mais de 20 anos de experiência na área, a professora afirmou que considera a proposta positiva.

Imagem ilustrativa da imagem Pais podem ‘bater de frente’ com proibição do celular em sala de aula? Entenda polêmica
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal

“No momento que se fala de comportamento, falamos de limites e entendemos que cada família tem sua forma de perceber qual é a educação que deve ser dada ao seu filho. Não existe receita de ser um bom pai ou boa mãe: vivemos momentos e realidades distintas”, considerou.

Para a educadora, muitas vezes os familiares agem de forma a compensar uma ausência de casa, por exemplo, permitindo que as crianças tenham acesso a tudo na hora e do jeito que querem, como para a utilização dos celulares.

“Muitos desses alunos que vivem muito no mundo virtual, que ficam ali muito fechados, acabam não tendo acesso a várias sensações e emoções. Eles não têm, muitas vezes, acesso a um ‘relacional’ muito importante, ao convívio com outras pessoas, têm dificuldade de relacionamento”, analisou.

“A escola é parceira da família, ela não caminha sozinha. Mas, principalmente depois da pandemia, algumas responsabilidades foram atribuídas à instituição, quando na verdade são da família”, afirmou, referenciando ao ‘controle’ do uso de celulares: “Essa proibição, antes de tudo, tem que ser validada em casa”.

Aspas

A disciplina às vezes é utilizada de forma pejorativa, mas deve ser construída com consciência

Sheyla Argolo, psicopedagoga

“A ideia e a proposta é positiva no sentido de tentar trazer o aluno para o foco e fazer com que ele, naquele momento, se desconecte das dispersões e distrações que a internet proporciona”, defendeu a psicopedagoga.

Sheyla Argolo destacou que, na prática, é necessário ter cuidado com a aplicação da nova lei, caso seja sancionada. Ela acredita que ser institucionalizada de maneira abrupta não vai trazer bons retornos de início, mas é um investimento válido.

“A partir do momento que uma escola diz ‘a partir de hoje, vocês não vão poder mais utilizar o celular, [será permitido] apenas em atividades que vamos avisar previamente’, inicialmente vai ter muita resistência, boicote, um monte de família ligando e muita gente contra. Mas é um resultado que, em médio e longo prazo, vai conseguir ser legitimado”, declarou.

Expectativa é de que decisão seja instaurada de pouco a pouco
Expectativa é de que decisão seja instaurada de pouco a pouco | Foto: Reprodução/EBC

Trabalho coletivo

Outro ponto reforçado pela especialista foi a respeito da preparação de professores, gestores e outros profissionais da Educação ao lidar com a possível nova realidade. Segundo a educadora, é o momento de recalcular a rota para encontrar novas vias de atuação, sempre buscando o equilíbrio entre os elementos que compõem o espaço de aprendizagem.

“Sair da zona de conforto dá trabalho, mas é preciso usar a criatividade, a ludicidade, jogos não necessariamente tecnológicos, da utilização atrativa do quadro. Temos que sair dessa zona de conforto e buscar estratégias”, contou, acrescentando reconhecer que essa não é uma tarefa simples.

Para finalizar, Sheyla frisou que a ação conjunta entre mestres e gestão é o segredo para fazer girar a engrenagem da educação, mesmo que com as mudanças propostas pelo Projeto de Lei.

“Estamos falando de professores que trabalham em vários lugares e lidam com turmas de 35 a 60 alunos. Não pode se exigir que o professor tenha um olhar minucioso para todos, sem pelo menos fornecer as ferramentas necessárias para rever as estratégias aplicadas em sala de aula. E nada como uma coordenação que proporciona ações como a formação continuada, propõe discussões com temas que estão em evidência… eu acredito muito nessa parceria”, finalizou.

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