
Tido por muitos como “um lugar para morrer”, o Hospital Mont Serrat de cuidados paliativos luta constantemente contra esse estigma. Atendendo apenas pacientes com doenças terminais, cada leito é tido como muito mais que apenas uma sentença: são histórias, encontros e conexões que ultrapassam as paredes do antigo Hospital Couto Maia.
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Sendo o primeiro, e até então o único, hospital de cuidados paliativos do Sistema Único de Saúde (SUS), a unidade foi inaugurada em janeiro deste ano, no bairro de Monte Serrat, em Salvador, e atende a regulação estadual de pacientes terminais. Mas, mesmo recebendo apenas enfermos que possuem pouco tempo de vida, a taxa de alta do hospital é de 37%.
A diretora de cuidados médicos do Mont Serrat, Yanne Amorim, explica que os pacientes com sintomas sanados e a doença sob controle são liberados e passam a ter seus tratamentos em casa, até o momento de sua partida.
“A gente tem uma equipe multidisciplinar. Temos suporte psicológico, social e espiritual – contamos com capelania. E, dentro desse núcleo, a gente sinaliza para o paciente qual foi o objetivo de ele ter vindo para cá. A gente explica para a família por que ele veio e o que oferecemos para ele aqui”, explicou a paliativista.
Mas há quem não queira deixar o hospital, mesmo depois de estar estável. É o caso de Atailton de Jesus, de 50 anos, morador da cidade de Bonito, na região da Chapada Diamantina, que fica a 450 km de Salvador. Ele foi diagnosticado com um câncer severo que o colocou diretamente na fila de pacientes paliativos. Quando recebeu a regulação para o Mont Serrat, há um mês, os médicos de sua cidade acreditavam que ele morreria durante a viagem para capital. No dia em que conversamos com o agricultor, ele acabava de receber a notícia de sua alta.
“O que a gente recebe aqui é amor, carinho, cuidado. A diferença é enorme dos outros hospitais. Esse Monte Serrat é um exemplo a ser seguido para quem quiser construir outros hospitais paliativos. Esse hospital foi construído e planejado, em cada detalhe, para que o paciente se sentisse em casa. Eu mesmo, pela minha vontade, eu ficaria aqui, não voltaria para casa, mas a gente sabe que aqui eles cuidam da gente e depois precisamos ir para casa”, confessou Atailton.

Segundo o filho do paciente, Lucas Moreira, de 21 anos, o tratamento médico e humanizado da unidade influenciou diretamente na melhora do estado de saúde de seu pai. “Ele mudou da água pro vinho. Vivia triste, não queria falar com ninguém, vivia cabisbaixo. Mas depois que veio pra cá, que conheceu a equipe, acabou melhorando, mudou a fisionomia. Agora está feliz da vida, vivendo muito bem e comendo bastante", pontuou o jovem.
As histórias do Monte Serrat reforçam que o hospital não é um local apenas de despedidas, mas também de encontros que marcam toda uma vida, como o caso da cuidadora de idosos Lívia Ramos e da paciente Ivanildes dos Santos. A acompanhante, de 43 anos, chegou ao hospital como cuidadora de outra paciente e acabou criando um laço com a carismática Ivanildes, vítima de um Acidente Vascular Cerebral que resultou em diversas outras cirurgias.
Lívia, após a morte de sua primeira paciente, se dedicou exclusivamente aos cuidados da senhora de 57 anos, ao ponto de deixar toda a sua vida em Salvador e se mudar para Jiquiriçá, cidade natal de Ivanildes, quando ela recebeu alta. “É uma coisa que só Deus pode explicar, porque eu sinto as dores dela, quando ela está feliz, quando está triste. Foi um amor incondicional, é de outro mundo, é espiritual”. Por conta de uma piora em seu estado de saúde, Ivanildes precisou retornar ao Mont Serrat.
Para a cuidadora, mesmo com seus anos de experiência profissional, o avanço que sua paciente teve, através dos cuidados recebidos pela equipe da unidade, não seria possível em outras unidades: “Ela chegou aqui sem falar, sem comer, recém-traqueada. Eu acompanho a melhora dela. Esse hospital está de parabéns, eu aplaudo de pé”, disse.
*Sob a supervisão do editor Jacson Brasil