
O Hospital Monte Serrat de Cuidados Paliativos, localizado no bairro de mesmo nome, em Salvador, possui uma nobre missão, mas carrega um grande estigma. Gerenciado pelas Obras Sociais Irmã Dulce, é tido por alguns como “um lugar para morrer” e desconhecido por muitos outros.
O primeiro e, até então único, hospital público exclusivamente de cuidados específicos para pacientes terminais tem uma equipe de profissionais que possui como objetivo a cura de todas as dores que possam acometer um paciente, sejam elas físicas, emocionais, sociais e até espirituais.
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A palavra paliativo deriva do latim pallium, que pode ser traduzida como manto, uma cobertura, um alívio para as agonias ou, para os profissionais envolvidos nos cuidados com os pacientes do Monte Serrat, um abraço de empatia.
Recebendo pessoas de todas as regiões da Bahia, a unidade desafia o estigma e, mesmo atendendo apenas pacientes com baixa (ou nenhuma) expectativa de cura, consegue uma taxa de quase 40% de altas médicas.
“Cuidado paliativo não é sobre morte, é sobre alívio de sofrimento e qualidade de vida. A gente cuida de pessoas que, de fato, têm uma doença incurável, que chegam aqui com pouco tempo de vida, mas a gente tem alguns pacientes que, a despeito da doença incurável, conseguimos controlar os sintomas que eles estão apresentando. Quando eles estabilizam, voltam para casa”, contou Yanne Amorim, médica pneumologista e paliativista que dirige a equipe médica da unidade de saúde.
Yanne também esclarece que, após a alta, os pacientes que necessitam não ficam sem um acompanhamento em casa. Através de uma solicitação, os médicos conseguem fornecer os suprimentos e serviços essenciais para o bem-estar em domicílio, como cilindros de oxigênio e até sessões de fisioterapia. Além disso, a equipe do hospital capacita os familiares e cuidadores para o tratamento no lar. Mas as portas nunca estão fechadas: em caso de piora do estado de saúde, os pacientes retornam à unidade.
E quem cuida de quem cuida de gente?
A vaga é clara: lidar com pacientes terminais todos os dias. Mas, para quem cuida de gente, um leito é muito mais que apenas uma pessoa com a doença. Histórias, encontros, conexões e despedidas fazem parte do dia a dia desses profissionais, e, para quem assumiu o compromisso de lutar pela sobrevivência do outro, deixar partir é um desafio. Por isso, as equipes do Monte Serrat contam com iniciativas para aliviar as tensões do trabalho.
O Hospital de Cuidados Paliativos não conta com Unidade de Terapia Intensiva (UTI), tampouco com centro cirúrgico. Por isso, não existe nenhum tipo de intercorrência em caso de parada, pois o objetivo principal é tornar a partida a mais confortável possível para o paciente. A assistência humanizada é a base para um atendimento paliativo eficaz e com qualidade. Por isso, a humanização dos colaboradores também é pensada pela gestão do Monte Serrat.
Com oficinas de treinamentos que buscam orientar os profissionais para que vejam a morte como uma fase da vida e não como uma dor, a equipe de assistência social e a comissão de humanização capacita os trabalhadores do hospital e ainda promove o compromisso de um bom atendimento por parte de quem cuida de pessoas tão vulneráveis.
“A comissão de humanização trabalha na perspectiva de ofertar a assistência humanizada ao paciente, mas também cuida do colaborador”, disse a coordenadora de Assistência Social da unidade, Luciana Azevedo. Segundo ela, é preciso fornecer humanização aos colaboradores para que eles possam fornecê-la aos pacientes.

O hospital ainda não conta com um atendimento psicológico exclusivo para os funcionários. Então, caso sintam necessidade, em meio à forte emoção ou perda sensível, buscam um dos psicólogos plantonistas para receber suporte. Mas essa realidade está prestes a mudar.
A psicóloga Zélia Correia revelou um plano de cuidado psicológico para os trabalhadores da unidade. Técnicos, enfermeiros e médicos passarão a receber uma atenção particular em breve. “Nesse momento, estamos com um projeto de um psicólogo exclusivo, que não tenha uma relação direta com os profissionais, porque isso é muito importante. Então, ele vai estar aqui como um plantonista, futuramente, para dar esse suporte psicológico aos trabalhadores, pensando que esse é um lugar de impacto. A gente lida com a morte todos os dias, e, para algumas pessoas, é muito sofrido ainda, então eles acabam sendo afetados emocionalmente”, contou a médica.
Com iniciativas assim, os relatos de diferentes funcionários se assemelham: apesar das perdas, o trabalho realizado ali é gratificante. A técnica de enfermagem Jildele dos Santos Evangelista diz que se encontrou no Monte Serrat: “Em outras instituições, a gente trata a doença em si, mas aqui não. Aqui tratamos o interior e o exterior, e esse é o grande diferencial, é onde eu me encontrei e amo trabalhar. Eu sou muito feliz aqui”, contou.