
Cerca de 23% das brasileiras sentem dor durante a relação sexual, segundo dados da FEBRASGO. A condição chamada dor genitopélvica à penetração, muitas vezes chamada de dispareunia, está entre os transtornos sexuais mais comuns, mas ainda é envolta por silêncio, vergonha e desinformação.
Embora muitas mulheres considerem o desconforto algo passageiro ou até “normal”, especialistas alertam que a dor não deve ser ignorada e pode indicar problemas físicos, hormonais ou emocionais que precisam de acompanhamento profissional.
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“É caracterizada por uma dor genital persistente ou recorrente, associada à tentativa ou ato de penetração vaginal. Essa dor pode ser na entrada da vagina, chamada de dispareunia superficial, ou mais profunda, podendo ser acompanhada de desconforto emocional, medo e tensão muscular”, explica a ginecologista e sexóloga Dra. Jussimara Steglich, membro da Comissão Nacional Especializada em Sexologia da FEBRASGO.
A médica destaca que a dor pode surgir em diferentes momentos da vida da mulher. Diferente do que muitas pessoas imaginam, não se trata apenas de meninas que estão inciando a atividade sexual.
A dispareunia pode surgir em qualquer fase da vida, inclusive após uma vida sexual ativa sem dor prévia.
Jussimara Steglich

Quando ocorre após esse período, o quadro é considerado secundário e pode ter relação com fatores físicos, hormonais, emocionais ou até conjugais, diz a médica.
Segundo a médica, as causas físicas mais frequentes tem relaçao com o pós-menopausa, amamentação, uso de anticoncepcionais hormonais, infecções recorrentes, cicatrizes do parto e alterações do assoalho pélvico.
No entanto, a dor não se limita ao corpo. Experiências traumáticas, repressão sexual, problemas de autoestima ou histórico de abuso sexual podem contribuir significativamente para o surgimento do quadro.
“As crenças disfuncionais sobre a sexualidade, ideias negativas sobre o corpo ou sobre o sexo, e até um relacionamento conjugal conflituoso pela falta de comunicação podem influenciar. A mulher pode ter uma baixa autoestima ou imagem corporal negativa, muito comum, por exemplo, na pós-menopausa ou após um câncer”, afirma.
A médica destaca o impacto emocional e psicológico vivido por essas mulheres. “Elas vão ter impacto na questão do humor, ansiedade, sintomas depressivos, autoestima, identidade sexual, autoimagem afetada. A mulher vai pensar ‘sou disfuncional’ ou ‘eu sou inadequada’”. Esse sofrimento, muitas vezes silenciado, também contribui para a evitação da penetração e o distanciamento do parceiro.
A importância do apoio do parceiro no processo de cura
O envolvimento e o acolhimento do parceiro ou parceira têm papel fundamental na recuperação. Para a ginecologista, o primeiro passo é validar o sofrimento da mulher: “Os parceiros precisam reconhecer que a dor é real, que não é coisa da cabeça da mulher. Ter uma escuta empática vai fazer com que ocorra uma redução da vergonha e da culpa que a mulher pode sentir”.

Segundo ela, a presença e o apoio emocional nas consultas, ou até mesmo na terapia sexual, podem melhorar significativamente a resposta ao tratamento.
Evitar pressionar a mulher a ter penetração também ajuda.
Jussimara Steglich
"Isso pode gerar uma melhoria por parte da mulher, que vai se sentir acolhida, vai sentir que o parceiro realmente tem muito carinho por ela", afirma.
Busca pelo tratamento
O tratamento da dor genitopélvica é multifatorial e deve ser individualizado. Pode incluir fisioterapia do assoalho pélvico, psicoterapia, uso de lubrificantes, hormonioterapia vaginal, técnicas de dilatação graduada e aconselhamento sexual.
O primeiro passo, no entanto, é romper o silêncio. “Sentir dor durante o sexo não é normal, nem vergonhoso. É comum, é real e é tratável”, diz Jussimara. “A dor não é sinal de fraqueza, é sinal de que o corpo está pedindo ajuda. Existe atualmente uma rede de profissionais preparados para ouvir essas mulheres sem julgamentos.”