
Com uma tarde cheia de batalhas de rima, poesia autoral e apresentações culturais, o Festival Literário de Dom Avelar (Flida) chegou ao fim nesta semana deixando um forte recado: a juventude periférica é potência quando encontra caminhos e oportunidades. Realizado entre os dias 12 e 27 de julho, o evento marcou a agenda do Julho das Pretas.
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Organizado pelo coletivo Kuá Ndanji e idealizado por jovens da própria comunidade, o festival trouxe uma programação diversa com saraus, rodas de capoeira, samba de roda, oficinas e música. A diretora executiva do Flida, Mona Kizola, de 23 anos, celebrou a realização do projeto e destacou a importância do evento para a identidade local. “A gente faz esse festival pela comunidade e para a comunidade. Conseguir realizar isso, sendo jovens da periferia e sem recursos, é uma grande felicidade”, afirmou.
Além da valorização da cultura, o evento se tornou uma plataforma de formação e pertencimento. “Hoje eu consegui ver que realmente sou uma produtora cultural. Isso é uma realização, não só minha, mas de todo o coletivo”, disse Mona, feliz ao relatar os desafios enfrentados para mobilizar a comunidade. “No começo foi difícil, mas aos poucos o bairro foi abraçando. Tivemos o apoio de comerciantes, moradores e parceiros importantes que acreditaram na proposta.”

Um desses parceiros foi a Cipó Comunicação Interativa, organização que há anos investe na formação de jovens como agentes culturais. Patty Sena, educomunicadora da instituição, explicou que o Flida nasceu dentro do LabCipó, laboratório de projetos juvenis. “Eles passaram por uma formação completa, desde elaboração de projetos até gestão de redes e audiovisual. O festival foi a aplicação prática desse processo. E ver tudo sendo executado com autonomia é a prova de que a juventude periférica só precisa de oportunidades”, destacou.
Potências das periferias
A batalha de MCs que encerrou o festival contou com a presença de artistas como Filipe Santana, 30 anos, morador da Palestina. Com sua trajetória marcada por ações culturais desde 2011, Filipe falou sobre o papel da arte como rota de transformação. “A gente canta para mostrar que nosso território é mais do que as violências que a mídia mostra. Somos cultura, somos potência. O rap é a minha forma de mostrar que a gente é capaz”, disse o artista, integrante do coletivo A Tribo.

Outro destaque foi Dandara Rohrs, de apenas 9 anos, que recitou poesias de autores negros como Nelson Maka e Giovanni Sobrevivente. Incentivada pelo pai, o militante Lúcio Portela, Dandara tem participado desde pequena de formações políticas e ações culturais. “Ela começou a recitar poesia com 4 anos. Sempre quer estar nas batalhas, nos teatros, nas rodas. E isso me enche de orgulho”, contou o pai. “Envolver as crianças com cultura é tirar elas da dependência do celular e apresentar outro mundo possível.”
Em sua poesia autoral, Dandara deixou um recado forte: “Se o mundo não te aceita por não ser perfeita, mostra para o mundo que você se aceita”. Um verso simples, mas que sintetiza a mensagem que o Flida espalhou pelas ruas de Dom Avelar.
E o futuro? Mona garante que o Flida não para por aqui. “Pode esperar a segunda, a terceira, a quarta edição. A gente começa e vai circulando. O círculo não se finda.”
