O secretário de Segurança Pública (SSP-BA), Marcelo Werner, visitou as instalações do Grupo A TARDE, na manhã desta quarta-feira (21), e concedeu entrevista exclusiva ao Portal A TARDE e a Rádio A TARDE FM.
Durante as conversas, o chefe da pasta falou sobre as ações empreendidas pelas forças de segurança para combater o tráfico de drogas, o recorde de público e prisões durante o Carnaval com a utilização da tecnologia do reconhecimento facial e fez importantes revelações sobre temas sensíveis como as apurações sobre a fuga do traficante 'Gel', que conseguiu escapar de um posto policial em plena folia, e o retorno da torcida visitante nos 'BA-VI's, o que ele espera ocorrer ainda no primeiro semestre deste ano. Confira abaixo a entrevista na íntegra:
A relação entre facções criminosas de outros estados e organizações na Bahia é um problema cada vez mais real. Como a SSP trabalha para combater essa prática?
Temos trabalhado não só no enfrentamento às facções, mas também em ações que permitam alcançar lideranças e investir na descapitalização desses grupos. Ano passado, durante essas ações, nós conseguimos apreender 12 toneladas de drogas, 55 fuzis, desarticulamos 19 laboratórios e alcançamos 33 importantes lideranças para a atuação das facções no nosso estado.
Começamos na mesma toada em 2024. Tanto que fizemos um balanço no primeiro mês do ano, onde divulgamos que já havíamos apreendido mais de 10 fuzis e sete lideranças. Hoje já são 12 fuzis apreendidos em menos de dois meses, seguindo o ritmo que temos implantado no enfrentamento e dando importância especial para a retirada dessas armas de circulação.
Sabemos que as facções são as maiores responsáveis pela violência, seja no combate entre elas, o que foi visto ano passado com a dinâmica da chegada e associação de uma facção grande do Rio de Janeiro com as facções locais, mudando o modo operante desse tipo de organização e criando esse enfrentamento, seja com as forças de segurança ou entre elas.
Então, o que a gente viu nesses últimos dois anos e meio aí foram, diversas viaturas que foram alvejadas no patrulhamento ordinário, policiais que foram feridos a partir do patrulhamento, ataques de facções em determinados bairros que eram dominados por outras facções e nós temos trabalhando cada vez mais nesse combate.
Existe um movimento de interiorização das facções criminosas, como se explica isso e o que a SSP vem fazendo em relação à prática?
A gente tem trabalhado com a inteligência para, novamente, articular as ações de descapitalização, desarticulação e enfrentamento à essa prática. A Força Integrada (FICCO) passou por curso especializado no ano passado e esse ano estamos instituindo a primeira Força Integrada em Ilhéus. Entendemos que o nosos estado é continental e que por isso precisamos chegar fortes no interior do estado.
A reestruturação que a gente fez no ano passado, quando assumi a gestão, já foi com esse viés. Um viés de fortalecer as forças de segurança no interior do estado, para que a gente se antecipasse a essa dinâmica que a gente vem observando das facções nas capitais e da sua busca pela interiorização.
E essa dinâmica criminal das organizações nacionais vem acontecendo em busca do domínio das principais rotas. E isso não é uma exclusividade da Bahia. Se você for parar para ver, todos os estados do Nordeste, em especial os de fronteira com os estados de atuação dessa organizações, estão com essa disputa.
Essa semana teve uma apreensão grande da Polícia Civil do Amazonas na Rota do Solimões, que é dominada por uma facção ali, e em um depósito havia um quadro indicando para aonde parte daquela droga seria destinada e eram estados do nordeste e do sudeste. A Bahia não estava na lista, apesar de sabermos que parte da droga chegaria aqui após passar por outros entrepostos das facções.
E isso confirma a dinãmica das duas principais facções que temos no estado, ambas do eixo do sudeste, e que se associam com facções locais para o tráfico de drogas ou de armas. É uma disputa comercial e empresarial. Brigam por um território, para mostrar que tem poder, e pegar aquele território de venda para ele. Essa é a dinâmica do crime organizado e temos trabalhado com a inteligência para continuar nesse enfrentamento.
Nesta semana houve uma publicação do Estadão que relatava a presença de integrantes de uma das maiores facções criminosas do país em prefeituras da Bahia e, inclusive, patrocinando eleições de vereadores. Existe algum monitoramento ou evidencia sobre isso?
A gente já viu essa dinâmica acontecer [em outros estados]. E lógico que é suscetível de acontecer no nosso. O que eu digo é que temos investigações e medidas em curso para antecipar que isso aconteça aqui. Se eu disser que está acontecendo, estaria sendo leviano e quebrando o princípio do compartilhamento de investigações em andamento.
A reportagem citou vagamente, mas não falou nenhuma cidade.Então você vê que é uma coisa jogada ao ar. O que eu posso dizer é que sim, nós temos investigações em andamento para antecipar qualquer movimentação nesse sentido.
Tivemos o "maior Carnaval de todos os tempos" esse ano e que foi amplamente elogiado por conta da segurança e da atuação da secretaria para garantir a integridade dos foliões. Como foi o planejamento para a festa?
Foi de fato o maior Carnaval de todos os tempos. Trouxemos algumas inovações como o Centro Integrado de Inteligência e Análise (CIA), que trabalhou junto dos órgãos de inteligência envolvidos na realização do evento, e tivemos a inovação do sistema de câmaras contabilizando o número de pessoas, o que foi muito importante pra gente ao longo do circuito, possibilitando por exemplo que tomássemos decisões corajosas, como o fechamento temporário de alguns circuitos no intuito de preservar vidas. A nossa expectativa era de ter o maior público de todos os tempos, visto que o Carnaval de 2023 já foi muito bom., com diminuição dos principais índices criminais.
Tivemos 400 câmaras espalhadas nos três principais circuitos e, a partir do usu das câmaras, essa contagem de pessoas nos portais que nos deu esse número estimado de 11 milhões de pessoas presentes ao longo dos dias do Carnaval e nos dias que antecederam a folia.
E qual o balanço sobre os resultados do uso da tecnologia do Reconhecimento Facial durante o Carnaval de Salvador?
Desde o início desse projeto, que foi iniciado em 2019, já alcançamos 1385 pessoas através do sistema. A gente já vem se acostumando a fazer o uso dessa ferramenta, em especial nos grandes eventos, e no primeiro Carnaval da minha gestão, em 2023, efetuamos a prisão de 77 foragidos. Esse ano tivemos 36 foragidos da Justiça capturados com a ajuda dos sistema.
A tecnologia tem auxiliado nas nossas ações de inteligência, permitindo que direcionemos o nosso policiamento e façamos o uso racional das forças de segurança no nosso dia a dia e em eventos da magnitude do Carnaval.
, eu costumo dizer, a gente tem que direcionar o nosso policiamento a partir de ações de inteligência, a partir de inovações, a partir do uso da tecnologia também, para fazer o uso racional das forças de segurança no nosso dia a dia. E assim a gente fez no carnaval.
Durante o Carnaval houve a prisão da sétima liderança de facção, o traficante conhecido como "Gel", porém, ainda no circuito, ele conseguiu escapar de um posto da Polícia Civil. O mesmo já foi recapturado, mas a situação liga um alerta sobre a atuação da polícial na ocasião. Como estão as investigações sobre o ocorrido?
A gente pediu a instalação do procedimento para apurar a responsabilidade dos policiais que estavam ali, das testemunhas, para ver o que aconteceu em relação à culpa, em relação a dolo, em relação à vulnerabilidade do equipamento, até para a gente melhorar se fosse o caso. De imediato, até para a preservação deles, houve a oitiva e o afastamento da escala para que a apuração caminhasse sem qualquer tipo de problema em relação a eles e ao trabalho que eles poderiam fazer
De certo ponto é inadmissível que a gente tenha que apurar o que aconteceu. [...] O próprio Gel, que foi recapturado, vai ser ouvido. Não posso adiantar o estado da investigação, até porque eu mesmo ainda não tenho o resultado por conta da compartimentação. Isso [se houve facilitação dos agentes] continua sob apuração, não recebi o relatório final ainda. O que pedi, e a doutora Heloísa [Brito] também pediu, é justamente um afino para a elucidação dos fatos
Sobre o funcionamento das BodyCam - as câmeras Corporais que serão acopladas nos uniformes dos policiais, quando elas estarão em atividade?
A gente assinou a homologação da licitação do sistema de câmeras corporais no final do ano passado e no início desse ano fizemos a emissão do registro de serviço e da autorização do registro de serviço de 1.100 câmeras. O prazo para entrega das primeiras que serão utilizadas é de 60 dias a partir da emissão desse registro e esses 60 dias vencem no mês de março.
Além disso, temos mais algumas câmeras doadas pelo Ministério da Justiça. Essas câmeras também devem chegar a partir de março e nesse tempo já estamos capacitando o nosso corpo policial e afinando os protocolos em relação ao uso desse equipamento, que será mais uma ferramenta integrada ao Centro de Operações de Inteligência da Secretaria da Segurança Pública, onde temos também um sistema de rádio e as câmaras urbanas já citadas anteriormente. Então, a nossa expectativa é que a partir do início da segunda quinzena do próximo mês, nós já tenhamos as primeiras câmaras à disposição dos policiais.
Quais os principais benefícios que o senhor vislumbra a partir da utilização dessas câmaras?
As câmaras trarão mais transparência para a atividade policial, não só garantindo a integridade do próprio policial que está fazendo o uso dela, mas do cidadão também. Às vezes uma imagem fala mais do que qualquer coisa e poderemos utilizá-la como meio de prova. Já estamos trabalhando na capacitação continua dos nossos policiais, mas, a partir da utilização das câmeras, já esperamos qualificar o procedimento da abordagem.
Um dos assuntos mais falados é a possibilidade da volta de duas torcidas nos estádios nos BA-VI. É uma possibilidade real? E para quando isso pode acontecer?
Há uma recomendação do Ministério Público em relação a termos torcida única, mas a gente entendeu o trabalho de todos, não só os clubes, a federação, o próprio Ministério Público, a Secretaria de Segurança Pública, mas todos os atores que fazem parte desse processo, em começar a conversa para viabilizar o retorno da torcida visitante. É importante frisar que a gente vem acompanhando e fazendo um monitoramento possível em grupos sociais, em redes, de pessoas transvestidas de torcedores, que na verdade querem promover a violência. Temos acompanhado isso.
Agora, anteriormente a esse BA-VI foram realizadas algumas ações prévias e até em outros jogos de torcida única foram realizadas ações pelas polícias para inibir situações de violência. Não podemos permitir isso esse tipo de ação nos estados, é inadmissível e faz parte do diálogo que a gente está fazendo.
Como eu disse, a segurança estará em condições para poder garantir a ida e vinda de todos, se assim for determinado, mas antes precisamos de um consenso. Eu percebo que os próprios clubes e a Federação tem que estar de acordo com isso, porque é uma soma de esforços. É uma retomada da confiança de que as pessoas vão poder frequentar os estádios como outrora, respeitando as diferenças e cada um indo para aproveitar o espetáculo de futebol e torcer para seu time sem qualquer tipo de violência.
Você acredita que isso pode acontecer ainda nesse primeiro semestre e que tenhamos um Ba-Vi com a torcida de ambos os clubes?
Então estamos no processo de discussão para essa retomadae eu acho que pode ser que aconteça [ainda no primeiro semestre]. Dependerá muito do diálogo entre os atores, das recomendações que o Ministério Público fará em relação à segurança, para as quais já nos colocamos em disposição para poder implantar o planejamento necessário, e até mesmo às exigências para clubes e federação. Hoje temos planos de sócios que basicamente enchem os estádios, então é necessário ver questões como a carga de ingressos, então tem que haver uma flexibilização dos clubes. Não é um ponto que só a segurança será necessária para fazer essa mudança. Tem que haver um consenso e uma união em torno desse propósito.