
O uso de tornozeleiras eletrônicas tem se tornado uma ação crescente utilizada por cada Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP) para ‘pegar a visão’ dos sentenciados que cumprem diferentes regimes. O caso mais recente foi o do ex-presidente Jair Bolsonaro - que tentou violar o equipamento e acabou preso - , levantando debates sobre o uso do aparelho.
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Segundo consta na Lei de Execução Penal (LEP – Lei 7.210/1984) o juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando:
➡️ Autorizar a saída temporária no regime semiaberto;
➡️ Determinar a prisão domiciliar;
➡️ Aplicar pena privativa de liberdade;
➡️ Aplicar pena restritiva de direitos;
➡️ Conceder o livramento condicional.
Compactas, com peso de aproximadamente 128 gramas e equipada com um sistema de GPS para o monitoramento, as tornozeleiras eletrônicas acompanham mais de 122 mil detentos, conforme dados divulgados este ano pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).
A medida foi introduzida na Bahia a partir de 2010/2011, segundo relata o especialista em Segurança Pública, Luciano Pontes, ao MASSA!. A ideia era incorporar a fiscalização remota e tecnológica ao cumprimento de pena dos custodiados. Tal aplicação refletiu, por exemplo, no recorte deste ano, em maio de 2025, quando a Bahia registrou o uso de 2.700 tornozeleiras eletrônicas.
“O monitoramento eletrônico permite que o apenado cumpra sua pena em regime mais brando, trabalhando e convivendo em sociedade, o que é essencial para a ressocialização, sem perder o controle estatal”, afirma.
Além disso, o uso do aparelho também garante cortes de gastos às penitenciárias:
O custo mensal de um monitorado por tornozeleira é significativamente menor (cerca de R$ 165,00 na Bahia, em 2019) do que o custo de um preso em unidade carcerária (média de R$ 3.000,00)
Especialista em Segurança Pública Luciano Pontes

Na concepção do pesquisador, o sistema oferece uma gestão de risco mais precisa, permitindo que as autoridades atuem de forma preventiva e imediata em caso de descumprimento das condições impostas. Já o sociólogo e especialista Antônio Mateus Soares destaca que o uso do aparelho não é equilibrado para todos os perfis de presos.
“Quando se faz um levantamento quantitativo, percebemos que a maior parte das pessoas monitoradas está na base da pirâmide social: moradores de áreas com altas taxas de violência em Salvador, pessoas desempregadas, fora da sociedade de consumo e, em grande parte, pessoas negras, que compõem os maiores índices”, reflete.
Marcos positivos e negativos na sociedade
Desde a sua implementação, o monitoramento eletrônico tem mostrado impactos positivos nos sistemas carcerários. Estudos citados pelo sociólogo e pesquisador em SSP Antônio Mateus Soares apontam que aredução da reincidência ocorre quando há um acompanhamento e suporte do estado.
“Alguns estudos — de dissertações de mestrado e teses de doutorado — mostram redução de reincidência quando a monitoração é acompanhada de programas de suporte. Estudos de caso e relatórios técnicos defendem também essa hipótese: o apenado deve ter acompanhamento psicológico, psiquiátrico, assistência social e trabalho para potencializar os resultados”, detalha.
Entretanto, nem tudo são flores, e o estigma social ainda é um obstáculo: “Na prática cotidiana, a tornozeleira muitas vezes funciona como rótulo público. Empregadores, vizinhos e agentes sociais podem discriminar o monitorado."

Por isso, evidências jurídicas pesquisadas enfatizam que o monitoramento deve ser acompanhado de políticas públicas que garantam direitos fundamentais aos detentos, como saúde, trabalho e assistência. Sendo assim, se trataria de uma estratégia para garantir que o indivíduo seja ressocializado.
“Por isso, é essencial que haja acompanhamento psicossocial, assistência social e reinserção no mundo do trabalho — porque isso impede que o monitorado retorne à vida do crime”, afirma.
Pontos a serem otimizados
Mesmo após cerca de 15 anos de uso no Brasil, o sistema ainda apresenta desafios e limitações em seu uso. O pesquisador Fontes alerta sobre alguns pontos que precisam ser otimizados.
➡️ Falhas de conectividade: em áreas com sinal de GPS ou de telefonia celular precário, o monitoramento pode ser intermitente, gerando "zonas cegas" e falsos alertas;
➡️ Autonomia da bateria: a necessidade de carregamento diário é um ponto de vulnerabilidade, pois o descumprimento gera alerta de violação;
➡️ Pronta resposta: a eficácia do sistema depende da rapidez da Central de Monitoramento em analisar o alerta e do tempo de resposta das forças policiais para localizar o monitorado em caso de violação grave;
➡️ Estigma social: o uso da tornozeleira gera um estigma social visível, dificultando a reintegração social e o acesso ao mercado de trabalho;
➡️ Proporcionalidade: há o desafio de garantir que a medida seja aplicada de forma proporcional e adequada, evitando o uso indiscriminado.
Tornozeleiras e o desafio da inserção social
Diante do cenário abordado pelos especialistas, ambos defendem a integração entre as frentes de segurança, como Justiça, polícias, assistência social e políticas de emprego para transformar o uso de tornozeleiras em uma forma de reinserir o indivíduo custodiado na sociedade e não apenas "vigiar e punir".
