Baiano que conquistou notoriedade internacional, Wagner Moura, o eterno Capitão Nascimento de “Tropa de Elite” (2007), é uma das estrelas de “Guerra Civil”, novo filme do diretor inglês Alex Garland (“Ex Machina: Instinto Artificial” e “Aniquilação”). No longa, ele interpreta o carismático correspondente de guerra Joel, um homem que é tomado pela adrenalina sempre que pisa em uma zona de conflito.
Formado em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Wagner conversou com o Cineinsite A TARDE e revelou como usou a formação profissional para viver o personagem. “O Joel é pura Facom. Facom na veia”, brincou. “Antes de fazer esse filme, eu fiz uma série chamada ‘Iluminadas’, em que eu faço um jornalista investigativo. Eu usei muito esse meu background de jornalista, todos os jargões, checagem de fatos e investigação”, continuou.
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Ele pontuou, no entanto, que correspondência de guerra “é um outro mundo” dentro do jornalismo. “A maioria dos meus amigos de Salvador são jornalistas, mas eu não conhecia pessoalmente nenhum jornalista de guerra. Eu procurei alguns para conversar, li muito sobre o assunto e realmente é um tipo de jornalismo muito diferente”, disse o ator.
Mas diferente do seu personagem, Wagner conta que não seria um correspondente de guerra. “Eu não gosto de armas. Eu ia ter medo, mas eu acho muito bonito e admirável, porque os profissionais colocam as suas vidas em risco para trazer a informação, para sensibilizar a nossa alma tão acostumada a tanta imagem. Às vezes, uma imagem, uma foto ou uma história, sensibiliza a pessoa para o horror que é uma guerra”.
O gatilho da câmera
"Guerra Civil” se passa nos Estados Unidos, em um futuro próximo, no qual 19 estados se separaram da União, e há um embate entre as Forças Ocidentais do Texas e da Califórnia e o poderio militar do governo federal estadunidense. Com o país imerso no caos, a fotojornalista Lee Smith (Kirsten Dunst), os jornalistas Joel e Sammy (Stephen Mckinley), e a jovem fotógrafa Jessie Cullen (Cailee Spaeny) partem em uma jornada perigosa e sangrenta de Nova York até a Casa Branca, em Washington D.C., com um só objetivo: entrevistar o presidente.
A direção de Alex Garland se destaca, principalmente, pelas cenas de ação, conduzidas de maneira a fazer o espectador entrar no campo de batalha. Os atores se movimentam quase como um balé em um cenário bélico. É interessante observar como até mesmo as câmeras utilizadas por alguns personagens são manuseadas quase como armas também, que não atiram, mas registram o horror para que, posteriormente, outras pessoas tirem suas próprias conclusões.
O roteiro de “Guerra Civil” coloca em evidência o papel do jornalismo e, principalmente, da fotografia. Alex Garland, que assina o texto, mergulha nesses assuntos e coloca em destaque o quanto os profissionais dessas áreas são, constantemente, expostos a riscos enormes e podem ter as suas vidas negativamente transformadas em prol da história perfeita - seja ela escrita ou fotografada.
Existem limites para conseguir a foto ou a história perfeita? Qual o momento de baixar a câmera? Vale a pena dedicar a própria vida a uma jornada que pode te levar à morte? Esses são alguns dos questionamentos deixados pelo filme. Para Wagner, a câmera precisar estar engatilhada para dar vez a quem sofre.
“Eu espero que as câmeras continuem sendo utilizadas como arma. É uma crise que a personagem da Kirsten Dunst vive no filme. O que ela está fazendo ainda faz sentido? As imagens que ela está trazendo para o mundo ainda sensibilizam as pessoas? Tem algum sentido isso? Tantas guerras seguem acontecendo. A minha expectativa é que o fotojornalismo e o jornalismo, em geral, sigam sendo como uma arma”, enfatizou Wagner. “O custo humano de uma guerra é muito alto. Eu espero que as imagens que os jornalistas arriscam as vidas para trazer continuem fazendo sentido e sensibilizando as pessoas”, completa ele, que ainda faz uma reflexão sobre o estado atual do jornalismo.
Esse é um filme sobre a importância do jornalismo, que está em crise. Os jornais demitindo, fechando, as pessoas se informando pelas redes sociais e as narrativas falsas circulando. O jornalismo é um pilar fundamental da democracia e ele vive uma crise, inclusive com líderes mundiais atacando jornalistas e colocando a vida deles em risco.
Wagner Moura, ator e diretor
Polarização política
Outro tema abordado no filme, porém, sem o mesmo aprofundamento, é a polarização política, cujos efeitos, Wagner classificou como “nefastos”. “A gente sabe bem o que é isso. Essa fictícia guerra civil acontece nos Estados Unidos, mas ela pode acontecer em qualquer lugar, em qualquer democracia polarizada. Nenhum país está imune a esse perigo”, alertou o ator.
Questionado sobre qual mensagem gostaria que o público extraísse do filme, ele disse que “as pessoas têm leituras diferentes". "Você fica até preocupado porque algumas leituras são opostas ao que você quis dizer, mas é parte do jogo. Para mim, pessoalmente, depois que eu terminei de fazer esse filme, eu comecei a achar que precisava ser menos combativo e escutar mais. Eu nunca escondi a minha inclinação política, de ser uma pessoa de esquerda e tudo mais. Mas hoje em dia eu acho que está na hora de construir mais pontes e ouvir mais pessoas que pensam diferente de você”.
Eu não conseguiria sentar para conversar com o nazista, uma coisa horrorosa dessa, mas se você só acha que o estado deve gerir o bem público, diferentemente do que eu penso, porque a gente se odeia? Está na hora de a gente se ouvir, conversar e de mudar de opinião, porque a polarização é uma coisa muito perigosa e, sobretudo, com o declínio do jornalismo.
Wagner Moura, ator e diretor