Imagine confiar em alguém o suficiente para viver uma experiência íntima, e, no meio do ato sexual, essa pessoa retira o preservativo sem avisar. Isso tem nome: stealthing. A prática, considerada uma violação do consentimento, tem impactos emocionais, psicológicos e riscos jurídicos e de saúde pública envolvidos.
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O termo, importado do inglês, ainda não consta literalmente na legislação brasileira, mas já é enquadrado como crime de violação sexual mediante fraude. Em situações mais graves, pode ser tratado até como estupro.
"O termo stealthing é uma importação inglesa, que não está no Código Penal com esse nome, mas a conduta, em si, é descrita no artigo 215, e consiste basicamente em uma violação sexual mediante fraude. Porém, se a prática for acompanhada, por exemplo, de violência física ou moral, existe o enquadramento no próprio crime de estupro, art. 213, do CP", explica a advogada criminalista Yanne Ávila, em entrevista ao Portal MASSA!
A pena prevista para quem comete stealthing é de 2 a 6 anos de reclusão. A advogada também reforça que não importa o tipo de relação entre os envolvidos, se são ficantes ou casados, não faz diferença.
A violência se confirma e não deve ser relativizada independentemente de ter ocorrido no âmbito conjugal ou não, para a lei e para o direito não há distinção nesse sentido.
Yanne Ávila
Como denunciar e reunir provas?
Como se trata de uma agressão íntima, a palavra da vítima tem um peso significativo, mas é importante reunir o máximo de provas possíveis para fortalecer a denúncia: exame de corpo de delito e provas documentais, como vídeos, prints etc.
Caso a vítima sofra resistência ao tentar registrar o boletim de ocorrência, é possível acionar instâncias superiores, diz Yanne: "Nesses casos, pode manter comunicação direta com o Ministério Público, além de tentar uma possível sanção administrativa para esses servidores/policiais, apontando a prática em suas respectivas Corregedorias".
Riscos à saúde do parceiro devem ser considerados
Para além da violação do consentimento, o stealthing também traz graves riscos à saúde. Segundo o médico infectologista Victor Castro Lima, a simples retirada do preservativo já representa uma abertura para o contágio de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).
A retirada da camisinha durante o ato sexual permite o contato direto da mucosa, que é uma forma de transmissão de algumas infecções sexualmente transmissíveis.
Victor Castro Lima
Muitas pessoas acreditam no mito de que ISTs só são transmitidas quando há ejaculação, mas não é verdade. "O simples contato de mucosa com mucosa, e aí pode ser mucosa do pênis com a vagina, com ânus, com a cavidade oral, pode levar à transmissão de infecção sexualmente transmissível", explica o médico.
ISTs como sífilis, herpes, gonorreia e clamídia têm alta taxa de transmissibilidade, e muitas vezes são assintomáticas. “Destaque à infecção pelo HIV, às hepatites virais, principalmente hepatite B e C, a sífilis... muitas vezes a pessoa pode ser colonizada também por algumas bactérias [...] e se essas infecções não forem rastreadas, eventualmente pode ocorrer a transmissão de uma forma inadvertida", completa.
Victor alerta ainda que, caso a retirada do preservativo tenha ocorrido sem o consentimento, é fundamental procurar atendimento médico o quanto antes. Além disso, o acompanhamento médico com sorologias após um mês e depois de três meses é essencial para garantir a saúde e prevenir infecções silenciosas.
Consentimento não é negociável
O stealthing é mais do que uma 'traição' ou 'trapaça' sexual: é uma violação da confiança, da saúde e do corpo do outro. Seja em um relacionamento estável ou em uma relação casual, consentimento é a base de qualquer prática sexual segura e respeitosa.
Se você foi vítima ou conhece alguém que passou por isso, denuncie e procure apoio médico e jurídico. Violência sexual não pode ser normalizada e nem silenciosamente ignorada.
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