
Quando se fala em sexo, muita gente ainda pensa imediatamente em penetração. Essa ideia, enraizada há séculos na cabeça das pessoas, continua moldando o imaginário coletivo, e, por tabela, impactando diretamente como as pessoas vivem (ou deixam de viver) o próprio prazer. Mas, afinal, o que é sexo “de verdade”?
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Para a psicóloga e sexóloga Sara Santon, a associação entre sexo e penetração tem origens históricas e sociais profundas, muitas delas ligadas ao patriarcado e à heteronormatividade.
"O sexo era visto como um meio de procriação, o que coloca a penetração atrelada à reprodução. Além disso, a indústria da pornografia chega reforçando o sexo de forma performática, como se a única maneira de existir prazer fosse com a penetração , muitas vezes de forma agressiva, vulgar e fantasiosa", explica.
Essa visão limitada do sexo reforça um mito que ainda resiste: o de que uma relação só é "completa" quando há penetração. "O prazer masculino, especialmente o orgasmo com penetração, é colocado como o objetivo final nas relações. Isso gera comportamentos repetitivos e uma ideia de que o sexo ‘real’ só acontece com penetração, quando muitas vezes as chamadas ‘preliminares’ ou outros contatos são até mais satisfatórios", diz a especialista.
Sexo sem penetração é sexo, sim
Sara reforça que uma relação sexual é qualquer forma de interação íntima que envolva troca de prazer: pode ser beijo, sexo oral, masturbação mútua, carícias... tudo isso também é sexo. "O nosso corpo possui diversas zonas erógenas e muitas nem conhecemos. O prazer é subjetivo e não depende de uma única prática”, afirma.
É totalmente possível ter uma vida sexual satisfatória sem penetração.
Sara Santon

E por falar em prazer, a ideia de que o orgasmo feminino acontece naturalmente com a penetração também precisa ser revista. Segundo a sexóloga, essa expectativa causa frustração e insegurança em muitas mulheres.
"A maioria das mulheres não atinge o orgasmo com penetração e muitas acreditam que há algo de errado com a sua vulva. A estimulação clitoriana é essencial para a maioria delas chegarem ao clímax. São mais de 8 mil terminações nervosas!".
Prazer não tem roteiro
Para desmistificar de vez essa ideia de que "sexo = penetração = prazer", é preciso entender que penetração é só uma entre muitas formas possíveis de vivenciar a sexualidade. "Penetração é uma prática sexual. Prazer é uma experiência sensorial, emocional e subjetiva", afirma Sara.
Nem todas as mulheres gostam ou precisam de penetração para se sentirem satisfeitas.
Sara Santon
A expectativa de que a penetração seja o "ponto alto" da relação também pode gerar impactos negativos na intimidade do casal. "Isso cria pressão de desempenho. Quando a penetração não ocorre ou não leva ao orgasmo, surgem questionamentos e frustrações. O sexo pode se tornar mecânico, perdendo a espontaneidade e o prazer em outras formas de intimidade".

Esqueça isso de preliminar!
Até o vocabulário que usamos interfere na forma como vivemos o sexo. Um exemplo é a palavra "preliminar". Segundo a sexóloga, ela carrega uma ideia de que existe um "antes" e um "durante", como se o sexo só começasse oficialmente com a penetração.
"Isso contribui para uma visão linear e hierárquica do sexo. Abandonar essa ideia permite que cada pessoa ou casal construa sua própria narrativa sexual, baseada no que realmente dá prazer e conexão".
No fim das contas, a dica da sexóloga é simples, mas poderosa: escutar o próprio corpo, se conhecer, se comunicar com o outro e não ter medo de sair do roteiro. Lembre-se: o prazer, afinal, não está num único ponto. Ele é o caminho todo!