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Outubro Rosa - 18/10/2025, 08:00 - Lais Machado

Câncer de mama: como fica a sexualidade após o diagnóstico?

Mudanças no corpo, queda da libido e medo da rejeição desafiam a sexualidade de mulheres que vivem com a doença

Metade das mulheres que enfrentam câncer de mama convivem com dificuldades sexuais por mais de três anos
Metade das mulheres que enfrentam câncer de mama convivem com dificuldades sexuais por mais de três anos |  Foto: Reprodução/ Pexels

O câncer de mama é a principal causa de morte pela doença entre mulheres no Brasil. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), de 2023, a taxa de mortalidade ajustada por idade chegou a 11,71 óbitos a cada 100 mil mulheres.

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Mas, a verdade é que essa é uma luta muito árdua também para quem sobrevive. Além de todos os efeitos de procedimentos como a quimioterapia e a radioterapia, as mulheres ainda precisam lidar com um inimigo conhecido: o espelho. Apesar de pouco estudada, a disfunção sexual em pacientes com câncer de mama é comum — ocorrendo em 25% a 66% dos casos.

Os maiores problemas são diminuição do interesse sexual (49,3%), dispareunia (35% a 38%), preocupações quanto à imagem (10% a 14%), segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia.

Nesta semana, o Portal MASSA! acompanhou, em Salvador, um debate promovido pelo Hospital Português, que reuniu pacientes e profissionais de saúde para discutir a sexualidade após o câncer de mama — tema ainda cercado de tabus e silêncios.

Impacto dos tratamentos na sexualidade

Cirurgias, quimioterapia, radioterapia e hormonoterapia fazem parte do tratamento, e trazem mudanças significativas no corpo: queda de cabelo, cicatrizes, perda de peso, falência ovariana, irritação vulvar e fadiga.

Essas alterações, segundo a Sociedade Espanhola de Menopausa e Federação de Sociedades de Sexologia, afetam diretamente a autoestima e a vida sexual. Como alguém que viveu isso, Erly Santos Ferreira, de 52 anos, conta que a recuperação da autoestima vai é de grande importância para as mulheres que tenham passado pela pelo tratamento:

“São etapas, situações muito delicadas, em que entra a autoestima, a emoção e também as questões psicológicas. Então, para que se tenha uma boa sexualidade após um tratamento como o do câncer de mama, é necessário estar bem consigo mesma, compreender essa nova fase e saber que continua sendo mulher, como sempre foi — só que de uma nova forma. É importante também buscar o apoio do esposo, da pessoa em quem confia, com quem vive", disse a servidora federal.

Aspas

A gente cresce com o nosso corpo perfeito, de acordo com a nossa formação biológica, aquela que o Senhor nos deu. Se olhar e perceber essas mudanças depende muito do nosso preparo emocional e também espiritual.

Erly Santos Ferreira
Erly Santos Ferreira, servidora pública federal, participante do desfile
Erly Santos Ferreira, servidora pública federal, participante do desfile | Foto: José Simões/ Ag A TARDE

Ela passou por uma mastectomia radical com reconstrução e relata que o processo de aceitação foi lento, mas transformador. “A gente precisa se olhar com amor. Eu perdi o cabelo, chorei muito, mas aprendi a me ver reconstruída. A essência permanece", finalizou.

Quando o espelho vira desafio

Já a professora Eliana Duarte, que participou da mesa de debate, relembrou o impacto de se encarar pela primeira vez após a cirurgia.

“Eu não olhava. Chorava no banho, pensava: ‘como vou me ver agora?’ Tive que desapegar de roupas, lingeries e me redescobrir. Comprei roupas novas e aceitei esse corpo diferente, u perdi aquelas aquelas lingeries, os sutiãs que eu tinha. Eu usava acho que 44, 46, que eu tinha uma mama maior, e agora eu estou no 42, quase 40.”

Para muitas mulheres, o retorno à intimidade também exige tempo e apoio. “A gente passa por um momento de estar mais com a gente mesma. Nem sempre o sexo se faz presente, mas o cuidado é essencial. Sem cuidado, não existe relação. Quando acontece, acontece. Mas quando não acontece também, para mim, não tem muita diferença. Meu marido cuida muito de mim, mas quando não dá, não dá”, diz Eliana, aos 51 anos.

Imagem ilustrativa da imagem Câncer de mama: como fica a sexualidade após o diagnóstico?
Foto: José Simões/ Ag A TARDE

Segundo a Sociedade Espanhola de Oncologia Médica, 66% das mulheres que enfrentam dificuldades sexuais relatam impacto negativo no bem-estar geral, e 41% dizem perder confiança sexual. Mais da metade convive com o problema por mais de três anos após o tratamento.

Sexualidade e abandono

A perda de libido e as mudanças corporais podem abalar relações. Uma pesquisa da Femama, em parceria com o Datafolha e apoio da AstraZeneca, mostrou que 1 em cada 10 mulheres com câncer de mama foi abandonada pelo parceiro após o diagnóstico, e 4 em cada 10 sofreram demissão durante o tratamento.

"É engraçado que meu marido sempre me procurava, e eu pensava comigo mesma: ‘Mas o que é que ele tá enxergando em mim?’ Porque eu me via bem estranha. E, nesse quesito de mulher, isso mudou", disse. "Sinceramente, eu não me enxergava como mulher, não me via. Ficava em casa trancada, não queria que ninguém me visse", desabafou, Elma Xavier, de 46 anos.

O período para confeiteira foi conflitante. Enquanto estava triste pela aparência, agradecia do processo não ter sido tão agressivo.

"Ao mesmo tempo em que eu sofria com a minha imagem, estava feliz por praticamente não ter reações à quimioterapia. Não tive quase nenhum enjoo, nada do que seria esperado para um paciente oncológico. Isso me dava orgulho de mim mesma. Talvez seja nesse momento de me reencontrar que eu busquei uma força que nem imaginava ter", disse.

Elma Xavier, confeiteira
Elma Xavier, confeiteira | Foto: José Simões/ Ag A TARDE

Para ela, o apoio do marido foi essencial, e a recuperação da autoestima veio com o tempo.

Aspas

Você imagina que o outro está te olhando com o mesmo olhar que o seu, mas acho que ele nunca me enxergou daquela forma. Hoje, está tudo melhor. Já tem um cabelinho, um cílio para passar rímel. Então, você começa a se olhar melhor, a se enxergar no espelho, e isso traz muita autoestima de volta

Confeiteira Elma Xavier
Elma Xavier
Elma Xavier | Foto: Lais Machado

O papel do apoio psicológico

O psicólogo Alan Mesquita, do Hospital Português, explica que a sexualidade é um dos aspectos mais afetados durante o tratamento — e que o acolhimento faz parte da cura.

“O câncer ainda carrega um estigma social. Muitas mulheres chegam aqui e só então conseguem falar sobre a doença. É um processo de reconstrução do corpo e da identidade.”

Segundo ele, é fundamental que o acompanhamento emocional caminhe junto com o tratamento médico: “Elas vão trocando experiências, criando laços na quimioterapia. A sexualidade pode ficar em pausa, mas o afeto e o autocuidado ajudam na retomada da confiança e no reconhecimento de si".

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