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Mata atlântica preservada - 28/03/2025, 07:00 - Bruno Dias - Atualizado em 28/03/2025, 09:26

Salvador 476 anos: Parque São Bartolomeu é tesouro histórico da cidade

Reserva florestal tem uma forte ligação com os antepassados e um grande vínculo religioso

Parque funciona das  das 8h às 17h, com trilhas ecológicas e esportivas
Parque funciona das das 8h às 17h, com trilhas ecológicas e esportivas |  Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

Maior área de Mata Atlântica em zona urbana do Nordeste e segunda maior do Brasil, atrás apenas do Parque Nacional da Tijuca, no Rio de Janeiro, o Parque São Bartolomeu é um dos tesouros naturais e históricos que marcam os 476 anos de Salvador. Localizado em Plataforma, no Subúrbio Ferroviário, o parque tem uma forte ligação com os antepassados e um grande vínculo religioso.

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A visitação é gratuita e funciona diariamente das 8h às 17h. Suas atividades incluem trilhas ecológicas e esportivas, como rapel e tirolesa, com valores variados. A trilha do Instituto Trilha das Flores ocorre gratuitamente a cada dois meses. Já a Salvador Ecoturismo e Aventura promove trilhas quase todo fim de semana por R$30, com descontos para públicos específicos.

Para entender melhor a importância desse espaço na capital baiana, o Portal MASSA! ‘brotou’ no local, percorreu suas trilhas e bateu um papo com Glauber Machado, coordenador do Instituto Trilha das Flores Parque São Bartolomeu. Durante a conversa, ele contou detalhes sobre a história, os pontos mais bonitos e conhecidos do parque, além de curiosidades da região.

Confira o mapa do parque:

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Foto: Divulgação

História entrelaçada nas raízes do Brasil

Com raízes profundas na formação do Brasil, o Parque São Bartolomeu existe desde a década de 70, quando abrigou os primeiros povos do Brasil e fez parte da expansão dos indígenas e da colonização portuguesa. Reflexo disso é a presença de algumas estruturas antigas pela região, como igrejas, que estão próximas de serem demolidas.

"Os primeiros povos que viveram no parque foram os índios Tapuias. Eles foram dizimados pela expansão Tupinambá na costa nordeste do Brasil no final do século XIV. Quando os portugueses chegaram, os indígenas foram os primeiros a serem escravizados. Mas como resistiram muito, a coroa portuguesa começou a trazer africanos especializados em agricultura e mineração", explicou.

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Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

Foi nesse contexto que nasceu uma das maiores resistências da história. "Quando esses africanos chegaram aqui, aqueles que conseguiam escapar da coroa se escondiam dentro do parque. A conexão entre indígenas e africanos foi natural, eles se uniram contra a exploração e criaram um refúgio dentro da mata", destacou Glauber, que também informou que o local abrigou o Quilombo do Urubu, um dos maiores da região.

Ao longo dos anos que se passaram, o parque foi sofrendo modificações e atualizações, até que, com mudanças políticas, o governo do estado assumiu a gestão, que antes era da prefeitura, em 2010. Diante disso, a reserva passou por uma grande reformulação, até chegar ao que se conhece nos tempos atuais.

“Foi realizada uma grande revitalização, com a retirada de mais de 500 famílias que moravam dentro da área. Antes, para fazer essa trilha que estamos percorrendo, era preciso pular 20 ou 30 cercas. Agora, dá para caminhar tranquilamente até o Parque Pirajá. Mas, por ser um parque com forte cunho religioso, o São Bartolomeu infelizmente sofre preconceito religioso e institucional”, contou.

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Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

Religiosidade e tradições

A religiosidade é um dos pilares do Parque São Bartolomeu. Ao longo de todas as árvores e plantas do território, estão pontos ligados à cultura religiosa, como cachoeiras, pedras e lugares apelidados com nomes de diferentes orixás, se tornando um ponto de forte conexão entre os fieis e o sobrenatural.

“Na Cachoeira de Sumaré, por exemplo, há a Pedra de Xangô, a Pedra de Iansã e a Pedra de Sabalu. Os praticantes costumam se espalhar pelo parque para realizar suas cerimônias, como batismos na Cachoeira de Maria, por ser considerada uma fonte de água pura”, iniciou.

“A escolha do local depende da entidade a ser saudada. Quem quer reverenciar Xangô vai até a Pedra de Xangô, quem quer reverenciar Exu, procura a área destinada a ele, e assim por diante. O parque é diverso e vasto em sua própria natureza”, explicou.

Veja fotos dos pontos religiosos:

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Glauber também aproveitou o assunto religioso para revelar que o nome ‘São Bartolomeu’ tem origem na mistura entre crenças. Segundo ele, a nomenclatura faz referência a época das grandes navegações e tem origem portuguesa, reverenciando um guerreiro e o nome do primeiro forte da região: Forte de Sete Passagens de São Bartolomeu. Antes disso, a área era conhecida como Ribeira de Pirajá.

“A ligação com a religiosidade africana surge porque, durante o período colonial, os cultos de matriz africana eram proibidos. Para driblar essa repressão, os escravizados passaram a associar santos católicos a suas próprias divindades. Assim, São Bartolomeu foi relacionado a Oxum, Nossa Senhora, e outros orixás. Por isso, enquanto para o Candomblé a cachoeira do parque é chamada de Cachoeira de Oxumaré, para os católicos é a Cachoeira de São Bartolomeu”, afirmou.

Turismo e desmistificação da criminalidade

Apesar de ser um dos pontos históricos e turísticos da cidade, o parque ainda sofre com uma fama injusta de parte da sociedade de ser um local perigoso ou tomado pela criminalidade. O boato repercutido de forma negativa gera um receio em potenciais visitantes, que cismam com a segurança.

No entanto, Glauber garantiu que isso tudo não passa de um mito e que o local é totalmente seguro para quem quiser conhecer. "Existe um mito de que o parque é dominado pelo crime, mas isso não é verdade. Quem frequenta aqui sabe que é um espaço de paz, de conexão com a natureza e a cultura. O que acontece é que, como todo grande espaço público, precisa de mais investimentos em segurança e estrutura", pontua Glauber.

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Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

Diante disso, diversas iniciativas têm sido realizadas para promover o parque e atrair novos visitantes nos últimos anos. "A gente promove trilhas guiadas, eventos culturais e ações educativas para mostrar a riqueza do parque. Tem gente que vem aqui e se surpreende: ‘Nossa, eu não sabia que existia esse paraíso dentro de Salvador!’, contou.

Desafios ambientais e preservação

Porém, nem tudo no parque são flores, e a preservação ambiental é um ponto destacado por Glauber. “Em 2010, um incêndio devastou uma grande área do parque. A suspeita é que tenha sido causado por uma vela deixada por um religioso em um ato de fé, sem saber do risco. Infelizmente, muitas espécies foram perdidas. Algumas podem ter rebrotado, mas ainda não fizemos esse levantamento. A recuperação aconteceu de forma natural, sem intervenção humana além do controle do incêndio”.

Outro problema recorrente é a qualidade das águas que passam pelo território. Apesar de ter sete cachoeiras, a reserva permite que apenas duas sejam liberadas para banho, pois as outras foram reprovadas devido à contaminação pelos esgotos clandestinos e a falta de saneamento básico.

"Em 2023, fizemos uma análise da água em quatro cachoeiras do parque, em parceria com a turma de engenharia sanitária. Duas foram reprovadas, a Cachoeira de Oxum e outra que apresentou alto índice de poluentes e produtos químicos. Já a Cachoeira de Oxumaré foi aprovada e é própria para banho", explica Glauber.

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Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

Moradores do parque

Apesar de terem sido tiradas do parque no processo de reformulação e indenizadas para apartamentos do programa Minha Casa Minha Vida, algumas famílias ainda residem dentro do parque, como um morador que vive da reciclagem de garrafas PET e ajuda a manter a cachoeira limpa, e uma família que vive de geração em geração.

"Tem um senhor de mais de 80 anos que nasceu e cresceu aqui. Ele nunca foi ao centro da cidade. A casa dele fica aqui mesmo. Ele trabalha coletando garrafas PET, entra no rio, recolhe e vai além disso. Passa o dia inteiro nessa atividade. Quando junta uma quantidade, revende e consegue fazer um dinheirinho", informou Glauber.

Morador recolhe garrafas PET do parque para vender e garantir a limpeza do local
Morador recolhe garrafas PET do parque para vender e garantir a limpeza do local | Foto: Clara Pessoa/Ag. A Tarde

“A família vive no local desde a década de 1940, mantém o direito de posse e atua na preservação do parque, impedindo desmatamento e cultivando mudas. Apesar de habitarem uma área sob domínio ambiental, desempenham um papel importante na conservação da floresta”, finalizou.

Futuro

O Parque São Bartolomeu está com o futuro sendo discutido pelo governo, com diversas ideias em pauta. Uma delas é transformar a área em uma reserva extrativista dentro da cidade, algo que ainda não existe no Brasil. Outra proposta é criar um Parque Marinho pra ajudar a preservar a Enseada dos Tainheiros e a Baía de Todos os Santos.

Além disso, também existe a proposta de recuperar a foz do Rio do Cobre e manter a conexão da comunidade com o parque, respeitando todas as tradições que já acontecem.

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