
Trabalho tem hora marcada, consulta médica tem hora marcada, até sessão de cinema tem hora marcada. Mas... e sexo? Nas últimas semanas, uma polêmica tomou conta das redes: o chamado 'toque de recolher do amor', que prevê a proibição de relações sexuais após ás 22h em condomínios residenciais.
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Para esclarecer o assunto, o MASSA! trocou ideia com o advogado Alex Lopes Guimarães, especialista na área, para deixar claro o que pode e não pode.
‘Toque de recolher do amor' – pode ou não pode?’
A polêmica teve início em agosto deste ano, quando um condomínio residencial em Santa Catarina aprovou a medida que proibia sexo e outros comportamentos com barulho após as 22h, após cerca de 18 reclamações formais de vizinhos sobre barulhos durante a madrugada.
Mesmo com essa 'onda' do momento, o advogado alerta que o regimento interno não pode interferir na vida íntima dos moradores, já que a Constituição garante a inviolabilidade da vida privada e da intimidade (art. 5º, X, CF/88).
“O condomínio é, em essência, uma entidade de administração coletiva, não pode proibir relações sexuais dentro das unidades autônomas, sob nenhuma justificativa”, acrescenta Guimarães.
A sexualidade sempre esteve envolta em regras sociais, religiosas e culturais, mas nunca coube a um condomínio essa decisão
advogado inscrito na OAB/BA sob o nº 41.335, pós-graduado pela UFBA e pela Escola de Magistrados da Bahia, Teólogo e discente em Filosofia Alex Lopes Guimarães
Barulho x Lei do Silêncio
Ainda segundo o advogado, o problema não está no ato sexual em si, mas no excesso de barulho que perturba o sossego dos vizinhos.
“Cada município brasileiro possui sua própria legislação - a chamada Lei do Silêncio, que estabelece limites de emissão sonora em decibéis para determinados horários e atividades”, comenta.
Em Salvador, por exemplo, a Lei Municipal nº 5.354/1998, alterada pela Lei nº 5.909/2001, define os seguintes limites:
🔊 60 decibéis (dB) no período noturno (das 22h às 7h);
📢 70 dB no período diurno (das 7h às 22h);
🔉 55 dB para máquinas, motores, compressores ou geradores estacionários no período das 7h às 18h;
📣 50 dB para os mesmos equipamentos entre 18h e 7h.
A lei ainda detalha como deve ser feita a medição: “A aferição deve ocorrer a 2 metros de qualquer divisa do imóvel da fonte emissora, com aparelho protegido contra vento. Caso seja realizada dentro do imóvel do reclamante, deve acontecer no recinto de maior incômodo, com o aparelho afastado no mínimo 1,5 metro de paredes e aberturas, que devem estar abertas”.
Por isso, para que se comprove excesso de barulho, não basta apenas uma denúncia: é necessário o uso de decibelímetro homologado pelo INMETRO, seguindo os critérios da lei.
Alex ainda ironiza a possibilidade de aplicação da regra dentro dos lares.
“Agora, imagine a cena no mínimo inusitada de um síndico ou administrador tentando medir, com aparelho técnico, o barulho de um ato sexual dentro de uma unidade: além de constrangedor, seria absurdo. Ainda que certos ruídos possam gerar desconforto, trata-se de algo inerente à intimidade humana”, reflete.

Vida íntima 'sem capa'
Uma possível proibição nesse horário, segundo a psicóloga e sexóloga clínica Sara Santon, poderia afetar diretamente a vida conjugal.
“O sexo não é só um ato físico, é conexão, é escape, é cuidado. E limitar isso pode gerar frustração, distanciamento e até mexer com a autoestima do casal”, detalha.

Ela explica que não existe um horário “certo” para os casais se relacionarem. Para muitos, o fim do dia é o período mais comum justamente porque a rotina já está concluída e a casa mais tranquila.
“Cada casal tem seu ritmo, sua rotina, e o que funciona pra um pode não funcionar pro outro. Mas a verdade é que, pra muita gente, o fim do dia, geralmente depois das 22h, é quando rola mais espaço pra intimidade”, detalha.
Sexo antes de dormir: benefício ou mito?
Para algumas pessoas, manter relações antes de dormir traz efeitos positivos comprovados. “Pra alguns, transar antes de dormir ajuda a relaxar, alivia o estresse, melhora o humor e até melhora o sono — e isso tem respaldo científico”, garante Santon.
Esse efeito acontece porque o corpo libera hormônios como a oxitocina e a endorfina, que ajudam no bem-estar e na qualidade do sono. Mas isso não significa que o período noturno seja regra.
"O importante é o casal se escutar, se ajustar e encontrar o que funciona para os dois. Sexo tem a ver com presença, com vontade, com conexão - e isso não tem hora marcada", explica.
O que não dá é pra se prender a regra ou mito
psicóloga e sexóloga clínica Sara Santon
*Sob a supervisão do editor Pedro Moraes