Em Salvador, onde o ‘corre’ no trânsito é constante, os espaços que deveriam ser de tranquilidade, como as ciclovias e ciclofaixas, têm sido de 'dores de cabeça'. Os atropelamentos constantes, que também ocorrem em outras grandes cidades brasileiras, escancaram problemas graves, como a imprudência de motoristas.
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Não à toa, o levantamento Perfil do Ciclista 2021 indicou que mais de 1.900 ciclistas morreram, no mesmo ano, em acidentes de trânsito no Brasil. Tal número equivale a 5% das mais de 33 mil mortes, conforme dados do Ministério da Saúde. De modo geral, a capital baiana é a 7ª capital com mais casos, o que chega a taxa de 0,24 acidentes com ciclistas por 100 mil habitantes.
Sobre essa questão, Danilo Costa, presidente da Comissão de Trânsito da OAB-BA e do Instituto Brasileiro de Direito de Trânsito (IBDTRANSITO), em entrevista ao Portal MASSA!, acredita que, apesar do problema não ser novo, tem ganhado proporções alarmantes.
“A gente vê uma frota de veículos que só cresce, infraestrutura precária e, muitas vezes, motoristas que agem na base da imprudência. Tudo isso, somado à falta de atenção ao planejamento urbano, torna o trânsito uma roleta-russa para pedestres e ciclistas”, destaca.
O cenário é sério: um estudo feito pela equipe de Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Salvador (PlanMob), de 2017, aponta que mais de 50% das calçadas da capital baiana são inadequadas. Sem opções seguras, muitos pedestres, por exemplo, acabam se arriscando em ciclovias ou ciclofaixas.
Casos como o do ciclista Daniel Bagdeve mostram os riscos que muitos enfrentam no trânsito. O homem relatou uma experiência negativa ao quase ser atropelado enquanto pedalava na orla do Porto da Barra. Em um vídeo postado nas redes sociais, ele contou que seguia pela ciclovia quando um carro, vindo na direção contrária, passou muito perto e não desviou.
“Tirou um fino tão grande de mim… Só se afastou porque viu que eu estava filmando. Botei a câmera bem na direção dele. Mas ele passou muito perto, gente. O retrovisor quase bate no meu guidão”, disse.
Para o ciclista Marcel Damasceno a qualidade das ciclovias em Salvador é uma verdadeira montanha-russa. "Algumas áreas possuem infraestrutura bem projetada e conservada, mas, no geral, muitas ciclovias enfrentam problemas, como manutenção, sinalização insuficiente e falta de conexão entre os trechos", conta.
Ainda de acordo com o atleta, as situações de risco são constantes. Uma das mais comuns que já presenciou é o desrespeito dos motoristas, que entram na ciclovia ou fazem conversões sem nem olhar pros ciclistas.
Segundo Marcel, essa é uma situação frequente e mostra a necessidade de mais conscientização no trânsito. "Graças a Deus nunca sofri acidente grave, mas sei que outros ciclistas passam por isso diariamente, e é preocupante", desabafa.
Lei é fechamento dos ciclistas
A legislação, porém, é clara. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) define que ciclovias e ciclofaixas são áreas exclusivas para ciclistas. Invadiu de carro? Multa gravíssima. Causou acidente? Pode ser responsabilizado criminalmente.
“Esses espaços são protegidos por lei. Quando um motorista desrespeita, ele não só infringe a regra, mas coloca vidas em risco. A gente precisa de mais agentes na rua e tecnologia para registrar essas infrações”, indica Danilo.
Além da fiscalização, o especialista também chama atenção para a falta de campanhas educativas: “Não é só punir, tem que ensinar. Motoristas, ciclistas e pedestres precisam entender o que é respeito no trânsito. Porque hoje, o que temos é quase uma guerra pelo espaço”.
Em relação a essas infrações, a Superintendência de Trânsito de Salvador (Transalvador) esclarece que, "conforme o artigo 193 do CTB, circular com o veículo em áreas como calçadas, ciclovias, ciclofaixas, passarelas, canteiros ou gramados públicos é considerada uma infração gravíssima". E a punição pesa no bolso e na carteira dos desavisados: multa triplicada, no valor de R$ 880,41, e 7 pontos na habilitação.
Não dá mais pra aceitar que espaços como ciclovias, que deveriam ser de mobilidade ativa, virem palco de tragédia
Especialista Danilo Oliveira
Para Danilo, a solução passa por um investimento pesado em infraestrutura, fiscalização mais presente e, claro, uma educação no trânsito de verdade. “A gente precisa mudar a cultura do trânsito. Não dá mais pra aceitar que espaços como ciclovias, que deveriam ser de mobilidade ativa, virem palco de tragédia. É hora de fazer um pacto pelo respeito”, analisa.
E para minimizar os riscos entre os ciclistas, o atleta Marcel Damasceno dá dicas importantes para os usuários de bikes. Se ligue nas orientações:
- A segurança deve ser sempre a prioridade;
- Usar capacetes, luzes e roupas reflexivas é essencial ao transitar de bike nas ciclovias;
- Estar atento ao trânsito, sinalizar suas intenções e optar por rotas mais seguras sempre que possível fazem a diferença;
- Seguir as regras de trânsito é fundamental para evitar acidentes;
- E por último e não menos importante: a conscientização de todos os envolvidos no trânsito é a chave para reduzir a imprudência.
Papel dos pedestres
A responsabilidade no trânsito , no entanto, não recai apenas sobre os motoristas. Pedestres também precisam ficar ligados ao atravessar esses espaços, bem como devem respeitar as áreas destinadas exclusivamente aos ciclistas. Só com esforço coletivo e políticas públicas eficientes será possível transformar as ruas de Salvador em um lugar seguro para todos.
“Sem educação, fiscalização e investimento, o caos só vai piorar. E quem paga o preço disso são as vidas perdidas”, finaliza o especialista Danilo Oliveira.
Posicionamento das entidades de trânsito
O Portal MASSA! buscou informações junto à Transalvador para saber se há estratégias para proteger os ciclistas. A pasta informou que não há fonte para falar sobre o assunto.
Já a Secretaria Municipal de Salvador (Semob) destacou que há um Plano Cicloviário em desenvolvimento na cidade, com foco na melhoria da estrutura já existente. Segundo o documento, ainda há muito a ser feito, como o aperfeiçoamento da sinalização, o ajuste da largura das faixas cicloviárias e a adequação à velocidade do fluxo geral nas pistas adjacentes.
Além disso, o aumento da conectividade entre as ciclovias é apontado como essencial para tornar o sistema de trânsito entre ciclistas mais seguro e atrativo. Como afirma o material, "apesar da infraestrutura cicloviária de Salvador ter sido amplamente incrementada, ainda há espaço para aprimoramentos em diversos aspectos relacionados ao tema cicloviário urbano."
*Sob a supervisão do editor Pedro Moraes