
O Bloco Afro Muzenza comemorou seus 44 anos de existência na manhã desta segunda-feira (5), com uma missa solene na Igreja do Rosário dos Pretos, no Pelourinho. Fundado em 1981, no bairro da Liberdade, em Salvador, o Muzenza nasceu como um tributo a Bob Marley e ao reggae jamaicano, tornando-se um dos principais representantes da cultura afro-baiana por meio do samba-reggae, ritmo que mistura o suingue africano com o reggae caribenho.
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A celebração foi marcada por momentos de reflexão sobre a trajetória do bloco, que, ao longo de mais de quatro décadas, tem sido símbolo de resistência, identidade negra e transformação social. “São 44 anos de muita atividade e, na realidade, de resistência”, afirmou o presidente do bloco, Jorge Santos. “Cada bloco afro tem sua especificidade, mas, quando se fala em luta e resistência, o Muzenza é uma marca.”
Apesar da importância cultural e social, o bloco enfrenta dificuldades financeiras recorrentes. “A gente precisa muito de apoio, não só das empresas públicas, como também das empresas privadas. Infelizmente, muitos não querem associar suas marcas aos blocos afro”, desabafou Jorge. Ele relembra com emoção um dos momentos mais difíceis da história do grupo, quando não houve tempo hábil para preparar as fantasias por falta de recursos. Ainda assim, o Muzenza não deixou de desfilar. “Foi um dos anos em que saímos mais bonitos. Quem tinha fantasia de qualquer ano pôde sair. Foi assombroso.”

Além dos desfiles, o Muzenza desenvolve projetos sociais que incluem aulas de percussão, dança, canto e idiomas como inglês, espanhol e, em breve, mandarim. As atividades são voltadas à juventude das periferias e reforçam o compromisso do bloco com a educação e o empoderamento da comunidade negra.
O bloco está aberto ao diálogo com empresas e instituições que queiram contribuir para a continuidade e ampliação de suas atividades culturais e sociais. “A gente precisa de parceiros fortes. O bloco de carnaval hoje é uma instituição empresarial, e, se não funcionar como empresa, fica apenas na resistência”, ressaltou Jorge.
Durante a missa, o padre Lázaro Silva, capelão da Igreja do Rosário dos Pretos e responsável pela celebração, reforçou a relevância do Muzenza para além do carnaval. “A cultura negra não é apenas dança ou batuque, é resistência. O Muzenza é um exemplo vivo disso. A presença de vocês aqui, nesta igreja, simboliza reconciliação e reconhecimento.”

Com mais de quatro décadas de história, o Muzenza segue enfrentando desafios para manter viva a cultura afro no Carnaval de Salvador. Geraldão, fundador e também presidente do bloco, relembrou as dificuldades vividas ao longo dos anos: “O Muzenza passou por momentos em que não tinha apoio de ninguém, só dos próprios associados. Depois vieram alguns apoios pontuais do governo do estado, como na época de Paulo Souto. Já com Jaques Wagner, houve um impulso importante com o processo Petrobras, que ajudou os blocos afro.”
Apesar dos avanços, ele denuncia as desigualdades na distribuição de recursos: “Tem artista que toca duas horas e recebe milhões, enquanto a gente, que desfila três vezes e trabalha o ano inteiro, mal consegue sustentar o projeto.” Emocionado, relembrou os sacrifícios pessoais que fez pelo bloco: “Já vendi meu carrinho de praça, vendi meu apartamento em Brotas para botar o bloco na rua. As pessoas pensam que é fácil fazer carnaval, mas não é. É muito suor e resistência.”
