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Especial Niver de Salvador - 29/03/2024, 06:40 - Da Redação

Bairro da Paz cultiva tradição baseada na música

A Batalha dos Arretados tem raiz no hip-hop e no rap, ou seja, a galera chega lá para competir quem rima melhor

A Batalha dos Arretados tem raiz no hip-hop e no rap, ou seja, a galera chega lá para competir quem rima melhor
A Batalha dos Arretados tem raiz no hip-hop e no rap, ou seja, a galera chega lá para competir quem rima melhor |  Foto: Paulo de Almeida Filho/ANF

Desde o início da vida em sociedade, a reunião de pessoas em uma praça para se expressar está marcada na história. Na modernidade, a ocupação dos espaços públicos é mais que expressão artística, é também resistência. Salvador tem muitas praças, e também tem muitos poetas… nada mais justo que unir o útil ao agradável.

No Bairro da Paz, uma iniciativa está revivendo essa “tradição milenar” uma vez ao mês. É a “Batalha dos Arretados”, um evento idealizado e realizado pelos próprios moradores para dar espaço àqueles que têm algo a dizer por meio da música. Eles se encontram na Praça Popular, que fica na avenida principal do bairro, em um evento que é aberto ao público e costuma reunir muitos moradores.

A Batalha dos Arretados tem raiz no hip-hop e no rap, ou seja, a galera chega lá para competir quem rima melhor. A ideia nasceu de Roque César, morador do Bairro da Paz há 36 anos, e que buscava algo para suprir um sarau que acontecia no mesmo espaço, mas foi encerrado e deixou a galera “órfã” da reunião cultural. “Queríamos ocupar essa lacuna, dar espaço aos artistas locais para compartilhar a sua arte. É uma oportunidade de resgatar a nossa juventude periférica, dar uma visão a essas pessoas, uma identidade cultural”, conta.

Tudo isso foi idealizado em 2022, e desde então vem ganhando corpo. As duas primeiras tentativas não deram certo, mas a terceira emplacou e caiu no gosto da galera, se tornando um compromisso certo no Bairro da Paz. Roque garante que é um evento familiar, reúne famílias, crianças, e por isso há preocupação com as rimas.

“Temos um regulamento e são proibidos palavrões e qualquer tipo de apologia à violência”, explica. “Esse é um espaço onde eles estão em casa, podem extravasar, falar daquilo que eles sentem de acordo com a realidade que eles vivem, mas é para todo mundo poder participar e criar espelho, referência, não afastamento ou intolerância”, ressalta.

O que a Batalha dos Arretados faz é construir pontes, dar oportunidade para que os jovens que sonham em viver da música possam colocar em prática aquilo que eles só viam pela televisão. Afinal, Salvador é, de fato, a cidade da música, mas não se encontra uma batalha de rima em qualquer esquina. Foi essa a oportunidade que o MC Bruxo da BA, que também faz parte do projeto, encontrou para se jogar nesse universo, participar das batalhas e colocar o seu trabalho na internet.

Disponível no YouTube, o clipe da canção “Pega Visão” é o retrato da realidade em que o artista vive. “Eu já perdi muitos amigos aqui dentro do bairro por causa de um caminho que não era legal. Então a Batalha dos Arretados faz um trabalho social de resgate desses jovens. Essa música é real, fala do que acontece no nosso dia a dia aqui na comunidade. A minha música é isso, baseada em fatos reais, falo do que eu vejo acontecer”, desabafa o Mc.

Rafael Deiró é outro Mc que está à frente da organização da Batalha dos Arretados e, para ele, esse evento mensal é um dos exemplos do que o Bairro da Paz tem para oferecer à cidade. “Nossa meta é que se torne uma grande batalha de rimas, porque de alguma maneira estamos dando o primeiro passo, oferecendo uma chance para que as pessoas mostrem o seu talento, aprendam, ganhem experiência para se formar como artistas e percebam que nada está cinza, que pode existir um mundo de cores, só precisa da oportunidade”, destaca Rafael.

São muitos aspectos envolvidos além da expressão artística. Há formação cidadã, promoção de lazer para os moradores da região, socialização da comunidade e até movimentação econômica, já que a reunião na praça também atrai pessoas para o comércio. Todo mundo ganha com esse movimento, principalmente o Bairro da Paz, que mostra a sua potência artística para a cidade.

Ali perto, no chamado KM 17, uma região de Itapuã, outro projeto também está criando pontes, desta vez por meio do esporte. Um projeto está ajudando a manter vivo o sonho de crianças e adolescentes que sonham em ser alguém no basquete. O Instituto Edu Mariano oferece aulas gratuitas no contraturno escolar no ginásio da Estação Cidadania, lá em Itapuã.

As aulas começam na categoria sub-16 e vão até o sub-23. A proposta é oferecer formação moral e educacional por meio do esporte para promover uma transformação social, especialmente em lugares de maior vulnerabilidade, além da chance àqueles que, apesar do talento e do sonho, não teriam condições de pagar pelas aulas.

A jovem Maria Vitória Damaceno, de apenas 15 anos, está há quase dois anos participando do projeto. Ela conta que tem aprendido muito, mesmo com algumas dificuldades, e um dos grandes aprendizados é que “aqui não é um lugar de desistir”, afirma. Apesar de se encontrar no basquete, essa não foi a primeira opção da garota. O sonho, de verdade, era o balé, mas a família não podia custear a aula. “Ter um lugar com esse é maravilhoso, ensina o amor pelo esporte e isso é incrível. Hoje posso estar aqui participando de campeonatos, sem precisar pagar nada para aprender, e posso sonhar em ser grande, em chegar à liga nacional”.

Assim como Maria Vitória, muitos outros jovens estão tendo a oportunidade de viver um sonho. Stella Lopes é a professora da unidade e, como a figura de alguém muito próxima aos alunos, entende qual é o impacto dessa iniciativa ali naquele bairro. “Isso aqui é importante porque a gente consegue mostrar às crianças que não existe apenas um caminho. O esporte dá novas perspectivas, elas podem sonhar com outras possibilidades para a vida”, garante.

Os treinos no KM 17 acontecem às terças e quintas, a partir das 14h. Os horários variam de acordo com a categoria, e para participar basta querer aprender basquete e ter disponibilidade para os treinos. O grande lance é que dali podem surgir grandes atletas, mas esse não é o único objetivo do projeto.

“É lindo ver que daqui podem sair grandes talentos, atletas que vão ganhar o mundo através do basquete. Mas é algo maior que isso”, explica a professora. “Porque o aluno pode não seguir carreira profissional, mas com certeza o esporte vai ter mudado a vida dele de alguma maneira, seja a atenção, a disciplina, o respeito ao próximo. Isso dificilmente a criança aprenderia na rua, sem a oportunidade de uma atividade como essa”, destaca Stella.

A iniciativa está de fato rendendo frutos. Stella conta que alunos formados pelo Instituto Edu Mariano que estão seguindo um caminho profissional no basquete, disputando o Campeonato Brasileiro, e outros treinando na base da categoria no Esporte Clube Vitória. “Eles estão aos poucos subindo de categoria e isso só é possível porque eles percebem que há espaço, que tem algum lugar para chegar”.

Um desses frutos é Jônathas Batista, atleta do sub-23 no instituto e que também já dá aulas, por isso é alguém que sabe bem qual o impacto do projeto na vida das pessoas. “É sobre tirar as crianças das ruas, sobre dar oportunidades. Eu vejo grandes atletas que surgiram de um projeto social, são muitas pessoas que não podem pagar para treinar, mas que buscam um espaço para isso. Que bom que existem lugares e pessoas criando essas oportunidades", diz

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