
Depois de uma semana de festival, a 20ª edição do Panorama Internacional Coisa de Cinema chegou ao fim. O último dia foi marcado pela presença de filmes com temáticas voltadas para o povo negro. Fechando o festival com chave de ouro, a sessão de encerramento contou com entrada gratuita, nesta quarta-feira (9).
O documentário "Brasiliana: O Musical Negro que Apresentou o Brasil ao Mundo" foi uma das obras exibidas. A produção acompanha a trajetória da companhia de teatro Brasiliana, responsável por levar a cultura negra e brasileira para o cenário internacional.

"Eles se apresentaram na América Latina, Japão, Rússia e passou totalmente em branco no Brasil. É um grupo que dividiu palco com os Beatles, Marlon Brando, Elizabeth Taylor, que representou o Brasil na Copa na Alemanha e que a imprensa praticamente ignorou por ser um grupo formado por um bando de pessoas periféricas, negras, dançarinos, capoeiristas, músicos e que faziam um show que contava um pouco a história do negro no Brasil", contou Joel Zito Araújo, diretor do documentário, em entrevista ao MASSA!.
Ao longo de 25 anos, a companhia se apresentou em mais de 95 países. Para o diretor, a falta de reconhecimento do grupo é uma consequência do processo de apagamento histórico que aconteceu no Brasil. "O século XX foi, em grande parte, um século de tentativa de apagamento das nossas heranças negras e indígenas, uma tentativas de branqueamento do país, se apropriando da cultura negra", completou.
Na edição deste ano, a representatividade foi um tema presente no Panorama, com o primeiro dia de festival sendo dedicado a filmes com temáticas indígenas. Filha de Joel Zito, a diretora Luiza Botelho ressaltou a importância de trazer essas pautas sociais para dentro do cinema. "Acho que, quando a gente fala de cinema, falamos de formação de ideias, opiniões. Trazer a representatividade para dentro do cinema é mais do que simplesmente discutir uma pauta, é ajudar a remodelar a forma como olhamos para nós mesmos como cultura e como nos colocamos para o mundo", pontuou.
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Assim como seu pai, Luiza também exibiu um filme na sessão de encerramento do Panorama. A diretora foi responsável pela criação do curta _Bela Lx-404_ , obra que ela conta ter surgido de um sonho. "Eu venho da produção, produzi muitos filmes do meu pai, o que me preparou para dirigir o meu primeiro curta. Entrei em contato com alguns roteiristas amigos, li alguns roteiros e não identicava com nenhuma história. Um dia eu tive um sonho com a história toda do curta e nele era a dona Léa que fazia a personagem. No dia seguinte, acordei e escrevi o roteiro em um dia", revelou.
Léa Garcia, atriz que dá vida a protagonista, foi a primeira brasileira a ser indicada ao prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes. "Bela Lx-404" foi o último trabalho da atriz, que faleceu em 2023. "Primeiro que foi uma honra trabalhar com a Léa Garcia. Segundo que foi uma escola, porque ela era um poço de conhecimento e talento que agrega muito, agrega para todas as pessoas que estão dentro do set, quanto para a história. Foi um presente poder trabalhar com ela", pontuou.
Luiz argumenta que buscou tratar da estética afrofuturista em sua obra. Dessa forma, o filme busca retratar um futuro a partir da perspectiva das pessoas negras. "Eu vejo que as pessoas estão muito engajadas com o tema, principalmente porque trata de inteligência artificial. Acho que o afrofuturismo tem essa coisa muito importante de projetar a cultura preta no futuro. A gente fala muito do futuro com brancos, mas não do futuro com pretos", afirmou.