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Então é Natal! - 23/12/2023, 06:30 - Cássio Moreira - Atualizado em 23/12/2023, 10:43

Saiyajin da Bahia? 'Nevou' faz a cabeça de toda a periferia

Tradição de pintar cabelo rompe barreiras preconceituosas e vira marca da garotada

Tendência do verão nas periferias, jovens procuram barbearias para aderir ao visual “loiro pivete”.
Tendência do verão nas periferias, jovens procuram barbearias para aderir ao visual “loiro pivete”. |  Foto: Uendel Galter/Ag. A TARDE

Pó descolorante, água oxigenada, resistência e muita pegada. Estes são os ingredientes necessários para meter o famoso 'nevou', a cara dos meninos da periferia de Salvador nas festas de final de ano. Quando chega o verão, é quase impossível não se bater com algum 'piva' de cabelo platinado ou 'nevado'.

Na rua Santa Luzia, no bairro de Periperi, Subúrbio Ferroviário da Roma Negra, Luiz Henrique, o famoso 'Sapo', realiza o sonho de largar o 'saiyajin' na pivetada. Ao Portal MASSA!, ele contou que iniciou no ofício em 2008, após participar de um projeto social para aprender a cortar cabelo. Segundo o barbeiro, cerca de 20 cortes são realizados diariamente no espaço em que trampa.

"Eu comecei em 2008, em março de 2008, em um projeto social, no qual o dono do projeto colocou os meninos daqui para cortar cabelo. Era ali na Praça da Revolução. Foi dali que eu aprendi, fui me dedicando. Hoje em dia estou aqui fazendo a cabeça da galera", explicou.

O processo varia de cabeça em cabeça. Sapo afirma que pra ficar na pegada 'batenu tenu', a 'mistureba mágica' precisa agir por cerca de 40 minutos, no mínimo. Durante a magia, o profissional passa várias mãos do produto no cabelo, sempre supervisionando para garantir que não vai rolar nenhum 'B.O'. Segundo o barbeiro, só no último Natal, 32 clientes meteram o nevou na cachola. O pacotão completo, com descoloração e corte, sai por R$ 80.

Loiro pivete é tendência no fim do ano
Loiro pivete é tendência no fim do ano | Foto: Uendel Galter/Ag. A TARDE

"A gente passa um produto que protege o couro cabeludo que não deixa tanta ardência. A gente executa o corte, não passando o navalhado, porque deixa o couro cabeludo mais propício à ardência, passa o produto para fazer a proteção do couro. Em seguida vem a aplicação do produto, que deixa de 40 minutos a uma hora, a depender da grossura do fio do cabelo. Vai de cabelo para cabelo. Depois de feito, a recomendação é que hidrate o cabelo", largou o profissional do corte.

Rompendo as barreiras

Estilo favorito dos meninos, o nevou já superou barreiras, segundo o próprio Sapo, e chegou até a turma dos bairros nobres, rompendo os olhares tortos e preconceituosos da sociedade, que por muito tempo associou o platinado à marginalidade e ao crime.

"Hoje em dia é mais tranquilo, mas antigamente era muito discriminado. Diziam que era coisa de quem não prestava, de malandragem, mas acabou caindo na tendência e todo mundo está aderindo", disparou Sapo, que continuou.

Aspas

Diziam que era coisa de quem não prestava, de malandragem, mas acabou caindo na tendência e todo mundo está aderindo

"Diminuiu (preconceito), mas mesmo assim ainda é discriminado, mas é mais porque eles não têm a capacidade de fazer. Eu acho que é mais por isso mesmo. Vem gente até de outra cidade, até de Camaçari, desde que comecei a passar nas emissoras. A caminhada é longa", completou.

Já virou tradição

Adepto do platinado há três anos, Vinicius Dias já largou a versão 2023 do saiyajin. Em papo com o Portal MASSA!, ele explicou que a ideia surgiu de forma espontânea, mas acabou virando uma tradição.

"Tem uns três anos já. Começou espontaneamente, vendo a galera 'nevou, nevou, nevou', eu falei, 'vou nevar também'. Eu já tinha feito luzes no cabelo, mas platinar, acho que a primeira vez foi no final de 2019. Acho bonito, quando era mais jovem achava uma parada radical. [...] Sempre falavam muito mal, e eu sou tirado a gaiato. Então, comecei assim e foi virando uma tradição", iniciou.

Segundo Vini, a ideia pegou tanto que já contagiou até a galera da família. "Meu primo agora faz também, ele é até uma pessoa com a cabeça mais fechada do que eu. Acabou virando uma onda, uma tradição [...] Minha mulher que não gosta, que ela quer que eu deixe o cabelo crescer, e não tem como platinar meu cabelo grande, porque ele é muito frágil, não aguenta química", meteu.

Depoimento do 'repórter saiyajin'

Eu, Cássio Moreira, repórter do Portal MASSA!, aproveitei e entrei na onda do nevou pela primeira vez.

Cria da periferia, fiquei receoso no primeiro momento por saber na pele como o ‘saiyajin’, mas acabei embarcando na aventura e meti o platinado. O processo foi rápido, durou pouco mais de uma hora. O resultado não poderia ser melhor. O nevou pegou legal e mudou a minha cara.

Cássio Moreira se meteu o visual loiro pivete na barbearia Corte do Sapo
Cássio Moreira se meteu o visual loiro pivete na barbearia Corte do Sapo | Foto: Uendel Galter/Ag. A TARDE

Quando cheguei na minha quebrada, geral tomou um susto com o visu novo. Me senti potente e acho que essa é a magia que o nevou promove. Desperta a atenção, representa um grito de existência e se coloca como uma ferramenta no enfrentamento ao racismo. Mais que um estilo, o nevou é um grito de resistência.

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