
Nas águas movimentadas da Baía de Todos-os-Santos, onde navios de carga cruzam com embarcações de lazer e terminais portuários operam sem pausa, a segurança é um elemento que não pode falhar. Com esse cenário em mente, guardas portuários da Bahia iniciaram um treinamento conjunto que une a experiência da Autoridade Portuária da Bahia – Codeba e a expertise da Polícia Federal, com o objetivo de preparar as equipes para atuar de forma mais integrada e eficiente na prevenção e combate a ilícitos em áreas portuárias.
A ação ocorre em um momento estratégico. Com o crescimento do fluxo de cargas e passageiros e a ampliação de investimentos no setor portuário baiano, aumenta também a necessidade de vigilância constante. Estima-se que mais de 70% das exportações e importações do estado passem pelos portos de Salvador, Aratu-Candeias e Ilhéus, movimentando produtos que vão do granel sólido ao contêiner refrigerado. Essa diversidade logística, vital para a economia, exige protocolos de segurança cada vez mais sofisticados para evitar que criminosos explorem brechas operacionais.
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Para o guarda portuário Esdras Nunes, a iniciativa é um marco. “Esse treinamento vai nos permitir intensificar o policiamento em toda a área portuária, tanto em terra quanto no mar, com profissionais ainda mais preparados”, avalia.
Nunes destaca que a capacitação não se limita a técnicas operacionais, mas busca alinhar procedimentos entre instituições, fortalecer a vigilância e aprimorar respostas a ocorrências. Um dos desafios que ele aponta é a conscientização da comunidade marítima de lazer, como condutores de lanchas e jet skis, sobre normas de segurança próximas a terminais portuários – regra muitas vezes desconhecida ou ignorada, com riscos para a navegação e as operações.

A cooperação entre a Codeba e a Polícia Federal foi iniciada com a assinatura de um acordo que prevê treinamentos teóricos e práticos, abrangendo desde prevenção de crimes e controle de acesso até uso progressivo da força e manobras de embarcações. O curso, iniciado no Porto de Salvador, será ampliado para os portos de Aratu-Candeias e Ilhéus, com conteúdos adaptados às especificidades de cada operação.
O delegado da Polícia Federal e responsável pelo Núcleo Especial de Polícia Marítima (Nepom) em Salvador, Márcio Cunha, explica que esta é apenas a primeira fase. “Estamos iniciando com noções básicas e disciplinas fundamentais, como manobras de embarcações, para fortalecer essa integração”, afirma. De acordo com ele, a meta é criar um padrão de atuação que permita respostas rápidas e seguras em situações complexas no mar e em terra, aumentando a capacidade de enfrentamento a crimes como tráfico de drogas, contrabando e outras práticas ilícitas.
Ação estratégica
Para o diretor-presidente da Codeba, Antonio Gobbo, o investimento tem efeito direto na economia baiana. “A proposta é ampliar a capacidade técnica dos agentes da Guarda Portuária para atuação em situações complexas, na Baía de Todos-os-Santos e em alto-mar, reforçando e ampliando a proteção nesta área que é estratégica para o Estado e o país”, afirma. Ele lembra que os portos baianos movimentam não apenas cargas, mas toda uma cadeia logística que depende de operações seguras e ininterruptas.
A seleção dos agentes segue critérios técnicos: experiência operacional, histórico disciplinar, perfil para segurança ostensiva e capacidade de multiplicar conhecimento junto às equipes. A expectativa é que a formação resulte na redução de vulnerabilidades operacionais, maior integração com outros órgãos e protocolos mais eficazes de resposta a emergências.
O conteúdo inclui fundamentos legais e éticos combinados com exercícios práticos, como abordagens em alto-mar, manuseio de equipamentos, navegação noturna e simulações de ocorrências reais. O uso progressivo da força segue diretrizes que priorizam a resolução pacífica das situações, escalando medidas apenas quando estritamente necessário.

A modernização da infraestrutura de segurança também está prevista no acordo, com drones para monitoramento aéreo, câmeras inteligentes integradas à Sala de Controle Operacional, embarcações específicas para patrulhas e equipamentos de comunicação segura. Essas ferramentas ampliam a capacidade de resposta e o controle das operações, alinhando-se às diretrizes do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).
Para o chefe de área da Guarda Portuária, Anderson Silva, o efeito da parceria vai além da capacitação técnica. Ele aponta que a integração com a Polícia Federal e outros órgãos, como a Marinha e a Receita Federal, fortalece o combate a crimes organizados que se aproveitam da complexidade logística portuária. “Esse trabalho conjunto é fundamental para aprimorar procedimentos e aumentar a segurança no nosso ambiente portuário”, afirma.
Com a ampliação do projeto, a expectativa das entidades é de que o modelo de integração entre forças sirva de referência para outros portos brasileiros. Além de reduzir riscos, a iniciativa reforça a imagem da Bahia como um hub logístico seguro, capaz de atrair novos investimentos e impulsionar o comércio exterior.
SIPAT estimula prevenção nos trabalhos internos dos portos
Dias após firmar um acordo com a Polícia Federal para reforçar a segurança nos portos da Baía de Todos-os-Santos, a Codeba voltou suas atenções para a segurança dos trabalhos e procedimentos internos dos portos baianos, com a realização da Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Assédio (Sipat) 2025.
Para o técnico portuário Camilo Araújo, a atividade tem reflexo direto no cotidiano. “A programação trouxe debates e dinâmicas que nos fizeram refletir sobre temas que vão além da segurança física”, destaca. “Falamos sobre saúde mental, ética, respeito e prevenção ao assédio, assuntos que precisam fazer parte do nosso dia a dia.”

O fortalecimento dessa cultura de prevenção e respeito se apoia em dois pilares distintos, mas complementares: a Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) e a Sipat (Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Assédio). A Cipa é um órgão permanente, com representantes eleitos e indicados pela empresa, cuja função é identificar riscos, propor melhorias, fiscalizar condições de trabalho e receber denúncias. A Sipat, por sua vez, é uma ação anual, que reúne palestras, treinamentos e dinâmicas voltadas para prevenção de acidentes, promoção da saúde e combate ao assédio.
Com a Lei 14.457, a Cipa ganhou nova atribuição: receber e apurar denúncias de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, garantindo o anonimato do denunciante. Na Codeba, esse avanço se traduziu em canais específicos, como e-mail institucional, o sistema Fala BR e o apoio da assistência social, que acompanha cada caso de forma sigilosa. “O mais importante é entender que a culpa nunca é da vítima”, ressalta Fabiana Santos, uma das palestrantes convidadas para a Sipat 2025. “Seja funcionário ou gestor, independentemente de onde venha a violência, é fundamental saber que quem sofre assédio não é culpado.”
Retomada
O engenheiro de segurança do trabalho Lucas Tinti explica que a mudança normativa também provocou uma reorganização interna. “Retomamos com a Cipa/Sipat em 2024, não tínhamos Cipa própria, pois integrávamos uma comissão que era composta por todas as empresas do porto”, conta. Ter uma comissão própria significa, segundo ele, mais agilidade na resposta a demandas, mais proximidade com os trabalhadores e maior autonomia para implementar melhorias.

Tinti reforça que a Codeba tem investido em programas contínuos de educação e segurança. Entre as ações estão levantamentos de condições de trabalho, campanhas educativas e atividades interativas voltadas para prevenção de acidentes e promoção de qualidade de vida. A ginástica laboral semanal, oferecida em parceria com o Sesi, é um exemplo de prática permanente que alia bem-estar e prevenção de doenças ocupacionais. Ciclos anuais de palestras e treinamentos em segurança e saúde ocupacional completam o calendário fixo.

O presidente da Cipa no Porto de Salvador, Camilo Araújo, ressalta que o trabalho da comissão vai além do cumprimento legal. “O propósito é informar a comunidade e os trabalhadores portuários sobre como criar um ambiente melhor, trazer qualidade de vida e aspectos de segurança e primeiros socorros”, afirma.
Além das iniciativas internas, a Codeba mantém parcerias estratégicas com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e com o Sesi para ampliar o alcance das ações e incorporar metodologias atualizadas em saúde, segurança e bem-estar. Essas colaborações viabilizam, por exemplo, a atualização constante de protocolos e a implementação de práticas alinhadas a padrões nacionais e internacionais.
Segundo a Codeba, a meta é avançar para um programa de qualidade de vida mais robusto, alinhado a práticas de ESG e envolvendo outros setores da sociedade, aproximando ainda mais o porto da cidade. Essa integração entre operação portuária, prevenção de riscos e respeito às pessoas é vista internamente como estratégica para manter a eficiência e a sustentabilidade das atividades.