
Salvador, que completou 476 anos no dia 29, é "dona e proprietária" da Ilha de Maré, um dos destinos mais paradisíacos da cidade. No entanto, segundo os nativos, as praias de águas cristalinas contrastam com a falta de infraestrutura básica, que impacta diretamente a qualidade de vida dos moradores e compromete a experiência dos visitantes que buscam aproveitar as belezas naturais do local. Ao Portal MASSA!, os nativos falaram sobre os desafios enfrentados no Caribe soteropolitano.
Travessia em busca de saúde

Rita de Castro, de 50 anos, nasceu e cresceu na Ilha de Maré. Desde pequena, faz a travessia para Salvador em busca de serviços essenciais. Acompanhada da filha de consideração, Ana Beatriz, e da neta Ayala Vitória, de apenas 8 meses de idade, a cuidadora de idosos contou as dificuldades que os moradores enfrentam quando precisam de atendimento médico especializado.
"Falta muita coisa na Ilha... Não há banco [por exemplo]. Alguns exames não são feitos lá, então a gente sempre precisa ir para a Suburbana. Essa é a maior dificuldade. Mas, mesmo assim, prefiro morar na minha ilha, viu? É muito mais tranquilo em relação à segurança", explicou Rita.
O desafio para estudar

Assim como a cuidadora de idoso, Bruna Rocha, de 18 anos, também conhece bem essa realidade. Nascida e criada na ilha de Maré, ela viveu por um período na capital, mas decidiu retornar ao sentir falta da tranquilidade do local. "Na Ilha é totalmente melhor em tudo, acho mais seguro e é um paz", declarou.
No entanto, contou que precisa fazer a travessia para Salvador com frequência para continuar os estudos, pois a Escola Municipal de Ilha de Maré não oferece ensino médio. "Eu vou para o colégio segunda, quinta e sexta, dias que ocorrem as aulas", contou, apressada para chegar no colégio.
A disputa no transporte marítimo

A concorrência entre embarcações menores e maiores também é um tema polêmico na ilha. O porta-voz de uma grande embarcação, que preferiu não se identificar, sugeriu que todas as travessias fossem organizadas a partir do atracadouro de São Tomé de Paripe, com bilhetagem eletrônica, horários fixos e fiscalização mais rigorosa. Segundo ele, as canoas que partem diretamente da praia acabam prejudicando as embarcações, já que operam sem controle. "Uma organização melhor ajudaria a garantir o fluxo de passageiros de maneira equilibrada e segura para todos", afirmou.
Renda ameaçada
Fazendo a travessia de pessoas na embarcação Rei Camaçandi, entre a Ilha de Maré e o continente, para complementar a renda vinda da pesca, Anjos Netos, de 41 anos, desabafou sobre sua preocupação com a chegada do inverno. Segundo ele, a vida financeira vira de cabeça para baixo devido à diminuição drástica no serviço de transporte.

"No verão, muita gente não quer esperar [encher] a embarcação maiores e preferem as menores. No inverno, a situação piora, porque menos pessoas atravessam, e nossa renda cai. Se houvesse um auxílio dos poderes públicos nessa época, ajudaria muito, porque sobrevivemos basicamente da pesca", sugeriu Anjos.
O pedido por um píer e orla

Morador antigo da Ilha de Maré, Alberico da Conceição, de 85 anos, mais conhecido como Berico, acompanhou de perto o desenvolvimento do local. No entanto, ele listou algumas necessidades que, se atendidas, podem melhorar a qualidade de vida dos moradores e a experiência dos visitantes as praias mais famosas da ilha.

"Falta uma orla, uma praça e um píer para facilitar o desembarque. Enquanto Santana, Praia Grande, Botelho e Bananeira já têm píer, Itamoabo e Neves continuam sem. Para embarcar ou desembarcar da canoa, é preciso entrar na água, o que dificulta muito, especialmente para idosos, pessoas com crianças ou com problemas de saúde", desabafou Berico ao lado de outros moradores, que temem que o mar invada suas casas devido à destruição da alvenaria de contenção de maré.
Clamor por um plano de ação
Dona de um restaurante na Ilha de Maré, que começou com um barraquinha na Praia das Neves há 10 anos, Deise Lúcia, de 46 anos, acredita que o desenvolvimento econômico da ilha depende diretamente da implementação de políticas públicas.

"Faltam políticas públicas, porque sem isso a gente não cresce, né? Você vê que o local precisa que os órgãos públicos olhem melhor. Isso atrai mais gente e faz a economia girar na ilha toda. Precisamos de uma orla e de um local adequado para colocar o lixo", apontou a empresária.
Em outro trecho da conversa, ela chamou atenção para o acumulo de lixo no local gerado por visitantes. "O turista vem, aproveita a ilha e depois deixa o lixo. No fim do dia, a praia vira a ‘praia do lixo’. A praia é nossa, o lixo é seu. Se você trouxe, por que não leva de volta? Quando veio, não trouxe, então por que não pode levar?", questionou, dizendo que esses tipos de pessoas não são bem-vindas.

Por fim, Deise Lúcia sugeriu a criação de um projeto para o desenvolvimento da Ilha de Maré, garantindo a participação dos moradores. "Essa é uma demanda que precisa ser discutida com a gente para o bem de todos. [Os políticos] precisam trazer pessoas para construir um projeto junto com a comunidade", declarou, apontando como sendo o caminho para melhorar a ilha.