
Com o avanço da internet, muitos donos de empresas viram nas redes sociais uma ferramenta importante para alavancar seus negócios. Muitas vezes, com vídeos engraçados e alinhados às trends do momento, os patrões acabam usando os funcionários para dar vida aos virais.
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Em alguns casos, a familiaridade com redes sociais e produção de vídeos já virou até requisito no momento da seleção. Mas o Portal Massa! foi saber: isso é legal, judicialmente falando?
De cara, é importante lembrar que o funcionário não é obrigado a gravar vídeo ou participar de ações de marketing da empresa. A Constituição Federal proíbe esse tipo de imposição, como explica a juíza Silvia Isabelle Teixeira, auxiliar da 33ª Vara do Trabalho de Salvador. Ao Massa!, a magistrada reforça que tudo depende de autorização do trabalhador.
“A Constituição Federal protege os direitos à privacidade, intimidade e imagem de qualquer cidadão, e o empregado se insere nesse contexto. Ou seja, apesar de o empregado ser subordinado contratualmente ao empregador, tal realidade não permite que este se utilize da imagem ou da voz daquele para qualquer fim, comercial ou não. Se o empregador pretende utilizar a imagem do empregado em vídeos nas redes sociais, deverá primeiramente obter autorização específica para tal fim, observando, inclusive, o tempo de veiculação dessas imagens”, explicou Isabelle.
A juíza ainda alerta que, se o patrão desrespeitar a vontade do funcionário, o caso pode parar na Justiça. “Caso o empregador faça uso indevido da imagem do empregado, tal ato pode gerar indenização por danos morais em favor do trabalhador”.
Casos cada vez mais recorrentes
O Massa! ouviu uma funcionária que passa por isso no trabalho. Sem querer se identificar, a jovem contou que o pet shop onde trabalha a obriga a participar dos vídeos e até a editá-los, o que gera sobrecarga e estresse no dia a dia.
Lá ele pic.twitter.com/kgcGAzsbgf
— Italo Marsinho (@ItaloMarsinho) September 4, 2025
“Eu comecei fazendo para ajudar as redes sociais da loja, que estavam largadas. Mas o meu patrão gostou e começou a me acionar sempre para realizar os vídeos do Instagram. Já cheguei a ter que gravar e editar fora do meu horário de trabalho para entregar no outro dia”, desabafou.
Patrão contesta
Também de forma anônima, um dono de restaurante contou que só escolhe funcionários que se sentem à vontade em frente às câmeras. Para ele, gravar vídeos pode até melhorar o clima da equipe.
“Acredito que tudo possa ser conversado. Jamais obriguei ninguém a gravar um vídeo. Já aconteceu de funcionário pedir para aparecer nos conteúdos, porque gostam de mostrar depois para a família ou amigos”, explicou o comerciante, que disse não temer cair na Vara do Trabalho por causa disso.
Psicóloga alerta
A psicóloga Joilma Nobre chama atenção para os riscos emocionais quando a imagem do trabalhador é usada sem os devidos cuidados. Segundo ela, isso jamais pode ser uma condição para manter o emprego.
“É importante deixar claro para o trabalhador que a permanência na oportunidade de emprego não pode estar relacionada à vinculação da sua imagem. Isso dá a ele segurança para expressar a sua vontade real”, afirmou.
Ela ainda lembra que a exposição negativa pode gerar sérios impactos. “Quando a exposição se transforma em algo negativo, há um risco muito grande do ponto de vista da segurança psicológica. O trabalhador pode se sentir constrangido, ridicularizado e até desenvolver ansiedade e afastamento social”, destacou.
Riscos de críticas
Quem usa redes sociais sabe: sempre aparece alguém para destilar ódio ou frustração nos comentários. E, segundo a psicóloga, esse tipo de exposição pode ser devastador.
“As consequências emocionais podem ser sérias: vergonha, ansiedade, queda da autoestima, insegurança e até síndrome do pânico”, alertou.
Por isso, Joilma defende que as empresas tenham protocolos claros para lidar com essas situações. “Cabe à empresa oferecer acolhimento, apoio psicológico e rever políticas de comunicação digital. Não basta dizer que foi brincadeira ou responsabilizar apenas o colaborador”, concluiu.