
Com a provocação “por quem a História do Brasil é verdadeiramente contada?”, o projeto de arte-educação Era Uma Vez…Brasil chega à sua nona edição em 2025 com o tema “Quem conta a nossa história? A participação indígena e afro-brasileira na formação do Brasil”. Voltada para professores e estudantes do oitavo ano da rede pública, a iniciativa busca recontar a trajetória do país para além das narrativas eurocêntricas ainda predominantes nos livros didáticos.
Na tarde desta terça-feira (19), no MAB (Museu de Arte da Bahia), foram anunciados os estudantes escolhidos para participar do intercâmbio cultural em Portugal. Cinco alunos e um professor da rede municipal de Salvador garantiram lugar na jornada que reunirá, em novembro, mais de 120 estudantes e professores brasileiros.
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Neste ano, o projeto mobiliza escolas de quatro estados e 14 cidades, incluindo Salvador, Mata de São João e Jacobina, na Bahia. A proposta acompanha o calendário escolar e se divide em quatro etapas: produção de HQs e vídeos, imersão artística, intercâmbio em Portugal e devolutiva comunitária.
A gestora do projeto, Marici Vila, explica que o objetivo é resgatar a verdadeira história do Brasil sob a ótica de povos historicamente marginalizados. “A gente sai da perspectiva eurocêntrica e entra em uma pesquisa mais profunda sobre quem foram os indígenas e os negros e o que eles contribuíram para o Brasil. Os estudantes percebem a potência desses movimentos e fazem a ligação do passado com o presente, entendendo que essas lutas ainda continuam”, afirma. Para Marici, o intercâmbio em Portugal é um dos pontos mais simbólicos da iniciativa: “Esses jovens chegam lá como agentes transformadores. Eles levam outra versão da história, promovendo um movimento antirracista e antixenofóbico que impacta também as escolas portuguesas.”

A professora de História Viviane Figueiredo de Almeida, da rede municipal de Salvador, acompanha o projeto desde sua chegada à capital baiana, em 2016, e considera a proposta fundamental para dar voz aos verdadeiros protagonistas da história brasileira. “O objetivo é trazer uma história mais realista, mostrando os heróis negros e indígenas esquecidos pela narrativa oficial. Mesmo os alunos que não seguem para o intercâmbio se beneficiam, porque todo o processo pedagógico valoriza a produção deles em sala de aula”, ressalta. Entre os intercambistas está Iago Victor Rodrigues, estudante da Escola Municipal Amélia Rodrigues, que sonha em conhecer Portugal e compartilhar suas experiências com os colegas. “Eu pretendo mostrar fotos, falar sobre a origem de Portugal e trazer novos projetos para a escola quando voltar”, conta.
Já a aluna Maiana da Silva Santos, de 14 anos, destaca a importância de abordar referências afro-indígenas nas produções: “Hoje em dia vemos influências que não agregam. Achei importante falar sobre intelectuais negros e indígenas e mostrar o quanto eles são relevantes.”
Desde sua criação, o Era Uma Vez…Brasil já beneficiou mais de 22,6 mil adolescentes de escolas públicas em diferentes estados, sempre com o apoio de professores, secretarias municipais de Educação e patrocinadores privados. Entre os resultados estão livros de HQs e curtas-metragens produzidos pelos próprios estudantes, disponíveis no canal do YouTube do projeto.

Um novo livro, reunindo 118 páginas de histórias em quadrinhos, será distribuído gratuitamente nas bibliotecas das escolas públicas e também em instituições de ensino em Portugal. Representando Salvador, foram selecionados o professor Carlos Augusto Fiuza Ângelo, da Escola Municipal Manoel Henrique da Silva Barradas, e os estudantes Hugo Felipe Coutinho dos Santos, da Escola Municipal Professora Eufrosina Miranda; Kézia Santana Araújo, da Escola Municipal Cidade de Jequié; Muktaar Aziz, da Escola Municipal Alexandre Leal Costa; Maria Vitória Barreto, da Escola Municipal Amélia Rodrigues; e Mayara Kesley Carvalho Santos, da Escola Municipal Manoel Henrique da Silva Barradas. O evento de anúncio contou com a presença de estudantes, professores e representantes da Secretaria de Educação de Salvador.

Durante dez dias em novembro, os soteropolitanos embarcam para Lisboa, onde viverão uma intensa imersão sociocultural. Além de visitar museus e monumentos históricos que narram as conexões entre Brasil e Portugal, o grupo participará de atividades em escolas portuguesas e trocará experiências com estudantes locais.
A viagem não é apenas uma oportunidade internacional, mas um processo pedagógico que, ao longo de 2025, convidou alunos e professores a refletirem criticamente sobre a formação da identidade brasileira.