Em um universo empresarial cada vez mais diversificado, muitas das pessoas que buscam empreender estão se destacando não apenas pela qualidade de seus produtos e serviços, mas também pela habilidade de se conectar aos seus clientes por compartilhar da mesma visão de mundo. Nesse cenário, duas mulheres baianas visionárias, mesmo em segmentos diferentes, não estão apenas construindo negócios bem-sucedidos, mas também desempenhando um papel fundamental na transformação das percepções sociais.
Por trás dos negócios de Madalena Silva, proprietária da Negrif, e de Aline Santana, dona da Caraminha, existe uma mensagem forte de empoderamento, autenticidade e geração de renda aliada à construção de uma rede que se reconhece na própria identidade.
Assim, essas mulheres não só constroem relações mais profundas com os consumidores, mas também inspiram outros a perseguirem seus próprios sonhos.
Vestir a mulher preta elegante
No efervescente universo da moda, é possível se destacar não apenas pelo talento e criatividade, mas também pela busca incessante em dar voz e representatividade àquilo que lhe inspira na maneira de se vestir. No caso de Madalena Silva, uma empreendedora visionária e proprietária da Negrif, impulsionar o seu negócio diretamente ligado à cultura afro-brasileira é um exemplo do que pode ser o sucesso conquistado com paixão, perseverança e um compromisso com suas raízes.
A Negriff completou 12 anos de loja física na última quinta-feira (8), mas a história de Madalena com a moda começou de uma maneira muito conhecida por aqui, as famosas sacoleiras. A sacola das roupas que ela mesma desenvolvia a acompanhava em todo e qualquer lugar que fosse e foi essa trajetória que a permitiu ser hoje referência para aqueles que buscam roupas que não apenas seguem as últimas tendências, mas também celebram a rica herança afro-brasileira.
No entanto, mais que colocar à disposição do mercado a beleza dos modelos, as cores escolhidas e as estampas de autoria da própria Madalena, a Negriff também atende a uma demanda muito específica: a de vestir a mulher negra com elegância, beleza, tecidos de qualidade e representatividade cultural.
“A marca tem uma identidade que é diferente. É um produto que valoriza seu tipo físico, seu tom de pele, sua identidade de se assumir enquanto mulher preta”, garante Madalena. “A gente tem uma estrutura corporal diferenciada, não dá para chegar numa loja em que um tamanho G não contempla o corpo de uma mulher com ancas e seios mais avantajados. Nós sempre estivemos à mercê de um mercado eurocêntrico que não valoriza a forma física dessa mulher”, diz.
Essa tem sido a característica da Negriff ao longo da trajetória da marca, oferecer um tipo de roupa que se adeque ao corpo dessas mulheres, mas que também as lembre de onde vieram. Há ainda uma relação comercial que Madalena considera muito importante. “Só de saber que tudo isso está sendo desenvolvido por uma mulher preta, também muda. As pessoas mais conscientes se preocupam com investir o dinheiro delas nesse tipo de negócio”, explica Madalena.
Autoestima sempre em primeiro lugar
Em muitos cenários, o desejo de empreender nasce de uma necessidade de curar algumas dificuldades que aquela pessoa já passou ao longo da vida. Imagine, por exemplo, uma mulher preta, de cabelo crespo, que sempre teve questões para encontrar produtos que atendessem às suas necessidades. Conhecendo bem essa dificuldade, Aline Santana usou a Caraminha para abrir essas portas.
Há três anos no mercado online, a Caraminha oferece produtos que respeitam as necessidades dos cabelos afro. Aline abandonou a contabilidade para se dedicar a esse negócio que ajuda muitas mulheres a conhecerem e cuidarem de seus cabelos com qualidade.
“Por muito tempo, alisamos esses cabelos, esticamos o quanto pudemos. Hoje em dia podemos ver mulheres realizadas, se sentindo bonitas. A autoestima da mulher negra é construída, a gente não nasce assim”, afirma Aline.
No entanto, além de autoestima, ela também escolheu levar conhecimento. “O foco era na venda de cosméticos. Mas vi um post no Instagram da Tia Má em que ela falava sobre ancestralidade, que antes dela teve outras pessoas. Ali eu pensei: a Caraminha vai existir, mas vai vir nesse viés de cultura afro, para que as pessoas conheçam mais desse universo”, conta.
Então Aline escolheu que, além dos produtos, as suas clientes também iriam interagir com a ancestralidade. Acompanhado dos xampus, condicionadores, finalizadores etc., sempre vai um mimo afro. Já rolou um chaveiro de bonequinha preta, um álbum de figurinhas de personalidades pretas, uma revista que reforça a beleza dos traços negróides e um cartão postal mensal que conta a história de uma figura importante; o de novembro, por exemplo, foi um postal de Dinha do Acarajé.
Aline acredita que essa entrega faz a diferença na vida de quem compra. “Eu sou uma afroempreendedora não só porque sou negra, mas porque levo esse conceito para dentro do meu negócio”, diz. “Eu revendo cosméticos, então elas podem encontrar em outros lugares. O diferencial da Caraminha é trazer um viés de conhecimento, de escuta. Eu procuro ressignificar a memória de autoestima dessa mulher”, explica Aline.